quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

HISTÓRIA DE FREI TITO em Poesia

Autor: Leonardo Sampaio

Recorro aos poderes divinos
Pra aqui me expressar
Sobre a história do cearense
Frei Tito de Alencar
Que viveu sua infância
E também adolescência
Nas terras do Ceará.

Fortaleza foi a Cidade
Lugar onde nasceu
Em 14 de setembro 1945
E entre amigos cresceu
Jogando futebol
Nessa cidade de sol
Onde brincou e viveu.

Filho de Idelfonso e Laura
Foi Congregado Mariano
Na Paróquia Cristo Rei
E aos doze anos
Estudando no Liceu do Ceará
Já começa a se engaja
Construindo o seu plano.

Ingressa em 1958
Na Juventude Estudantil Católica
Já sacudindo a velha postura da Igreja
E buscando a transformação histórica
De um mundo desigual
Encontrando na bíblia o visual
Dessa construção simbólica.

Em 1963 assume a direção da JEC
E pra cumprir o compromisso
Vai morar em Recife
Percebe o mundo omisso
Às desigualdades sociais
Resolve avançar mais
Não querendo ficar só nisso.

Em 1966 toma rumo radical
Por fé e política foi seduzido
Vai para Belo Horizonte
E lá foi conduzido
Pra o Convento Dominicano
Onde viveu durante um ano
E depois foi transferido.

Em 1967 chega em São Paulo
No Convento de Perdizes
Dos frades Dominicanos
Envolve-se com aprendizes
No movimento político
Um tanto quanto místico
De onde vêm suas raízes.

Era jovem muito alegre
Sempre bem humorado
Gostava de contar piadas
O estudo foi seu legado
E poesia apreciava
Violão também tocava
Canto lírico era seu agrado.

Seus engajamentos de fé e política
Feito em comunidade
Foi na Ação Católica,
Na JEC lutou por igualdade
Já na JOC outra missão apostólica
Era a Juventude Operária Católica
Onde lutou por justiça e liberdade.

Era contra a diabólica ditadura
Do golpe militar articulado
Em 31 de abril de 1964
Em que o presidente foi tirado
A democracia interrompida
As forças populares perseguidas
E opositores presos e torturados.

Marinha, Exército e Aeronáutica
O poder do Brasil assumiu
A juventude protestou
E o regime reprimiu
Operários e camponeses
Também foram pros xadrezes
Mas, a guerrinha resistiu.

Criaram leis arbitrárias
Proibiram reuniões
Cassaram mandatos políticos
Com o poder dos canhões
Transgrediram direitos humanos
Com torturadores tiranos
Nos quartéis e nos porões.

Nessa época Frei Tito
Consagrado Dominicano
Com fé e esperança
Saiu peregrinando
Contestando a ditadura
Numa luta ferrenha e dura
Defendendo o seu plano.

O sonho de um mundo justo
Que na bíblia se encontrava
Determinado por Deus
Como está na palavra
Que o Reino o povo constrói
E o amor ninguém destrói
Era nisso que Tito acreditava.

A cada dia crescia a fé
Com muita espiritualidade
O que fazia crescer a crença
Na justiça e na igualdade
E a construção do mundo novo
Com a força do povo
Pra viver em liberdade.

E assim empenhou sua vida
Em busca da construção
Do mundo justo e fraterno
Pregando pra toda nação
Esperança, amor e fé
Pra manter a luta de pé
E conquistar libertação.

Seus estudos lhes mostram
Que a partilha no socialismo
Pensado por Karl Marx
Precursor do comunismo
É à base da sociedade igualitária
Onde não tem, exploração proletária
E se vive o verdadeiro humanismo.

Um mundo assim é mostrado
Quando se faz a leitura
Nos atos dos apóstolos
Onde uma sociedade pura
Tudo que se planta
A todos alimenta
Com produção e fartura.

Nessa crença e engajamento
Frei Tito cria projeção
E enfrenta os poderosos
Crendo em Deus na proteção
E no Espírito Santo divino
Como luz, que ilumina o destino
Com coragem e determinação.

E assim, com compromisso e fé
Sempre presente na caminhada
Destacou-se como líder
Junto a UNE e a estudantada
Pra construir o Congresso
Com entusiasmo pra o sucesso
Enfrentando qualquer parada.

A ditadura proibiu
A UNE se organizar
E ficando clandestina
Sem ter onde ficar
Pra realizar o evento
Frei Tito ficou atento
Até encontrar o lugar.

 Foi um Sítio em Ibiúna
E lá começou o Congresso
Com 200 estudantes
E os milicos tiveram acesso
Invadiram o lugar
Pra prender e torturar
Em nome do progresso.

Em 1968 após prisões da UNE
Pela brigada militar
Os Dominicanos foi o alvo
E Frei Tito de Alencar
Aos 24 anos de idade
É preso como frade
Por desafiar o regime militar.

Em 1969 o Convento foi invadido
Mais uma vez frei Tito é preso
Arrancado lá de dentro
Tirado todo indefeso
Levado pra o Presídio Tiradentes
Por capitães e tenentes
Deixando o mundo surpreso.

Só em 17 de fevereiro de 1970
Do Presídio fora tirado
Pelo Capitão Mauricio Lopes Lima
Para que seja torturado
“Vai conhecer a sucursal do inferno”
Viverá sofrimento eterno
Pra nunca mais ser curado.

No Quartel viveu o calvário
Durante três dias de humilhação
Dependurado no pau-de-arara
Ou sentado, na cadeira-do-dragão
Feita de chapa metálica e fios
Com choques elétricos arredios
No corpo e palmatória nas mãos.

O ódio era tamanho
Que no âmbito da crueldade
Pauladas nas costas, no peito e pernas
Sem dó, nem piedade
Descargas elétricas na boca
Pra deixar a mente broca
E o celebro sem sanidade.

Vestiram-lhe de paramentos
Para dar a hóstia sagrada
Mandaram abrir a boca
Deram choque e porrada
E no corredor polonês
Pra lhes tirar a lucidez
Encheram-no de pancada.

Queimaram-no todo o corpo
Com ponta de cigarro
Tendões dos pés e ouvidos
Cuspe e escarro
Toda tortura valia
E com deboche sorria
Pra tira-lhes o sarro.

Capitão Beroni de Arruda Albernaz
Ordenou que: Se não falar
Será quebrado por dentro,
Sabemos como atuar,
Sem deixar marcas visíveis
Se sobreviver, aos sinais invisíveis
O preço da valentia, jamais esquecerá.

Pra completar a opressão
Três capitães revezavam
Maurício, Homero e Benoni
Eram eles que comandavam
Em nome do estado
Como animais adestrados
Matavam e torturavam.

Outro monstro que havia
Na Operação Bandeirante
Era o delegado Fleury
Torturador de estudante
Operários e pensadores
Carrasco a serviço dos opressores
Foi dele o martírio fulminante.

Com gilete cortou uma artéria
A viver e ceder
Na Bíblia ele escreveu
“É melhor morrer
Do que perder a vida”
Não via outra saída
Diante do maltrato e sofrer.

Quando Frei Tito cortou-se
Veio de cima uma ordem
“Esse padre não pode morrer”
Porque deve haver desordem
Se a Igreja se revoltar
E a resistência apoiar
E assim todos concordem.

Os estudantes saíram às ruas
Com passeatas em todo país
A UNE quem articulava
E ordenava a diretriz
Fora a ditadura
Abaixo a censura
Queremos o povo livre e feliz.

Era uma luta desigual
O capital se fortalece
Multinacionais invadem o país
E a ditadura endurece
Expulsa, prende e mata
A oposição não acata
E o regime enfurece

Os ricos ficam mais ricos
E o pobre é quem padece
Por isso precisa se unir
Com o fogo que aquece
E a força do Cristo
Assim dizia Frei Tito
Com fé ninguém esmorece.

Era guerra pra todo lado
O capitalismo crescendo
E o socialismo também
O mundo estava fervendo
Estados Unidos de um lado
E Soviéticos articulados
E as lutas sempre crescendo.

O mundo todo dominado
E o Brasil dividido
Entre estas duas forças
Soviéticos e Estados Unidos
De um lado a burguesia
Com mentira e heresia
E o povo confundido.

A busca do socialismo,
De estudantes e sindicalistas
Que acreditavam na revolução
Pra tirar os fascistas
Por meio da luta armada
Com a guerra decretada
Pra derrubar os capitalistas

Dessa forma se queria
A revolução brasileira
Com focos em todo canto
Da militância guerrilheira
E com fuzis enfrentar
O poder militar
Erguendo sua bandeira

Os Dominicanos eram próximos
Da guerrilha armada
Comandada por Marighela
Que cumpria uma jornada
Da Ação Libertadora Nacional
Confirmando seu ideal
Junto com os camaradas.

Frei Tito, na vida franciscana
Ao lado dos companheiros
Frei Betto, Oswaldo e Frei Fernando
Como grandes guerreiros
De luta e espiritualidade
Buscavam em Cristo a verdade
E a esperança no povo brasileiro.

Os três também foram presos
E sofreram a tortura
Do Capitão Benoni
Que servia à ditadura
Na caserna militar
E o DOPS era o lugar
De massacre a criatura.

Em dezembro de 1970
Frei Tito foi libertado
Trocado por embaixador suíço
Que foi sequestrado
Pela Vanguarda Popular Revolucionária
Saindo da penitenciária
Indo para o Chile exilado.

Em 1971 ainda do Chile
Assim escreveu nos anais
Para Wanderley Caixe
Reuniremos nossos ideais
De um socialismo de mão-cheia
Que no futuro o povo anseia
Pra viver dias florais.

Do Chile foi para Itália
Em busca de cuidado
Mas não foi bem recebido
Pois era considerado
Um frade terrorista
E o ato humanista
De apoio lhes foi negado.

Sentiu-se, apunhalado nas costas
Aí partiu, de Roma para Paris
E os Dominicanos o acolheram
Tornando-lhes feliz
E respirou aliviado
Mesmo com dor de ser exilado
Sem poder fazer o que sempre quis.

Voltar para o Brasil
Pra junto do povo amado
Essa era sua esperança
Que havia revelado
Para construir de verdade
Um país com equidade
Como havia traçado.

Em 1973 escreveu avaliando
Penso que a luta armada
Como luta principal
Já está abalada
E não é mais instrumento
Para a política do momento
E temo extermínio de camaradas.

Em 1974 das torturas não esquecia
E era o que lhe atormentava
Via a sombra do Fleury
O delegado que torturava
Como monstro perverso
Com valores reversos
Do que Tito acreditava.

O fantasma do DOI-CODI
Estava sempre presente
O DOPS e o Quartel
Não saia de sua mente
O Fleury aparecia
O tempo todo perseguia
Em torno do ambiente.

 Frei Xavier encontra Tito
Ele não deixa entrar
Porque o Fleury está aqui
E quer me capturar
Pra sucursal do inferno
Onde já foi preso interno
E pra lá não quer voltar.

Em 10 de agosto de 1974
Frei Tito foi encontrado
Em um galho pendurado
Achou melhor morrer
Do que a vida perder
E assim, foi suicidado.

Lyon foi à cidade da França
Onde o fato aconteceu
E também foi enterrado
Voltando pra onde nasceu
Quando houve o translado
De um pedido acordado
Pra retornar a terra onde viveu.

É no Cemitério São Batista
Que seu corpo descansa
Na cidade de Fortaleza
Onde se guarda a lembrança
Desse ilustre filho
Que na fé teve o brilho
E em Deus sua bonança.

Essa homenagem é preservada
Haja visto o dia de finado
Onde no Cemitério
É um dos túmulos mais visitado
Pelo povo fortalezense
E também cearense
E no mundo todo é lembrado.

Quem quiser conhecer mais
Essa história aqui contada
O Filme “Batismo de Sangue”
Traz toda ela filmada
Com poesia, canto e oração
Valores, resistência e opressão
Com tortura e uma vida barrada.

Essa é uma página da história
Que na escola não é contada
No Espaço Cultural Frei Tito de Alencar
Sempre será lembrada
Toda essa animalidade
Contra o princípio de liberdade
E de vida ameaçada.

À Frei Tito Mártir da Ditadura
Como caririense do Ceará
Que atravessou a ditadura
Lutando como carcará
Com garra e seriedade
No campo e na cidade

Minha homenagem aqui ficará.

Leonardo Furtado Sampaio é Coordenador Administrativo do Espaço Cultural Frei Tito de Alencar – ESCUTA e também educador popular, militante das lutas sociais, escritor e pesquisador da cultura popular e resgates de historias das lutas populares.

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