quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Etnias e outra economia

JORNAL O POVO
Artigo
Leonardo Sampaio
19 Fev 2010
“Economia e vida” é o tema da Campanha da Fraternidade que busca “colaborar na promoção de uma economia a serviço da vida, com consciência ambiental, sustentabilidade, dignidade da pessoa e o respeito aos direitos humanos”, segundo o Texto Base.
A economia vista como ciência, deve ser integralmente voltada para o bem comum, onde o Ser seja o centro e que Ele próprio domine a economia e não a economia o domine por meio do mercado, com o único objetivo que é o lucro, considerado também o deus adorável do capitalismo.
Vendo a economia pelo prisma da solidariedade, nas comunidades onde vivem os povos de etnias, é visível perceber a exclusão destes do mercado de trabalho e consumo na forma capitalista. Porém, é importante compreender que nestas comunidades formadas por etnias, a economia é dirigida para a satisfação das necessidades humanas sem ganância nem egoísmo. Lá é onde se pratica a partilha do que se tem, de forma solidaria. São pessoas de fé, que seguem à risca “a vida dos primeiros cristãos” (Atos 14), de seus orixás, da Mãe Terra e o pai Tupã, ou seja, todos são iguais nos olhares de suas espiritualidades. Faltando-lhes apenas as oportunidades que não lhes foram dadas desde a saída das senzalas e ocas.
Precisa-se ter muito cuidado ao abordá-los com projetos achando que o povo humilde tem que se adaptar ao mercado capitalista de produção e consumo, o que tem feito muitos técnicos, ONGs e governos nestas comunidades. São projetos que quase sempre não tem dado certo e os protagonistas saem culpando o povo de incompetente, onde a incompetência é de quem impôs um modelo econômico incompatível com a cultura local. As pessoas ali querem apenas o lugar para morar, trabalhar e viver com dignidade, utilizando apenas aquilo que a terra lhes oferece para viver.
O que é necessário fazer é ajudá-los a aperfeiçoar as tecnologias para melhorar a produção e agregar valores aos produtos a partir das matérias primas existentes nestas comunidades como é o caso de Caucaia, que dispõem de um potencial enorme de coisas possíveis de gerar trabalho e renda nas comunidades quilombolas, utilizando a própria natureza das Serras com vegetação verde que pode ser transformado em área de turismo comunitário, cultural e ecológico criando trilhas na floresta. Essa ação pode desenvolver uma cadeia produtiva sustentável desde a formação e capacitação de guias turísticos com crianças e jovens da própria comunidade, assim como motivar a produção de artesanato da palha de banana, da carnaúba e sementes construindo mercadorias utilitárias de fácil comercialização. A diversidade de frutas produzidas nestas comunidades é também uma coisa extraordinária, se lá mesmo é feito o beneficiamento, já podem vender diretamente para o mercado, livrando-se do atravessador que é quem mais ganha com a produção. Até mesmo o animal pode ser fonte de renda para passeios pelas estradas e Serras, o que é feito hoje nas praias de forma inadequada. Outra fonte que deve ser estimulada é resgatar a cultura que está adormecida e precisa ser revitalizada compreendendo que a arte é saúde e qualidade de vida em todos os recantos da humanidade. Por meio da arte e da cultura se trabalha o artesanato, a musicalidade a dança afro-brasileira e indígena. Nessa cadeia produtiva pode-se criar ainda, centros de alimentação da culinária afro e indígena de produtos da terra, incentivando inclusive a produção agrícola voltada para o abastecimento local.
São investimentos econômicos com expressões culturais possíveis de serem feitos a curto, médio e longo prazo. São investimentos que iram mostrar as belezas das Serras e do Sertão mudando radicalmente a qualidade de vida das pessoas destas comunidades e ainda criando divisas de raízes culturais de Caucaia com o mundo.
É fundamental para Caucaia avançar em políticas culturais de raiz e o Governo do Dr. Washington tem demonstrado sensibilidade neste sentido quando na Secretaria de Assistência Social é formado o Setor da Igualdade Racial, seguindo o Governo Lula que criou o Ministério da Igualdade Racial e na Secretaria de Articulação Política foi criado os Territórios Indígenas e Quilombola com a contração de três Agentes Territoriais destas etnias.
As etnias são formadas por pessoas simples, que mesmo tendo suas culturas próprias, são bombardeadas por outras culturas que nunca iram se adequar ao mundo delas. Por isso a razão de iniciar um processo de construção de políticas públicas sustentáveis na área da geração de trabalho e renda a partir de uma visão comunitária e as práticas da economia popular e solidária formando e capacitando pessoas no viés da produção coletiva e familiar.
O papel do Estado e dos Municípios nestes investimentos é apenas favorecer a estas comunidades, tecnologias adequadas para a vida no semi-árido a partir de suas raízes culturais locais com capacidade de atrair um turismo diferenciado, que gosta das artes, das trilhas ecológicas e gastronomia natural sem produtos agrotóxicos.
Que a Campanha da Fraternidade nesse ano de 2010, possibilite novos conceitos de economia que nasçam nos projetos, trazendo a discussão: Etnias com outra economia é possível.