terça-feira, 29 de setembro de 2009

Carta sobre experiências na Rede de Educação Cidadã

Leonardo Sampaio

Escrevo estas traçadas linhas para dizer que como educador popular na Rede de Educação Cidadã – RECID acumulei um grande aprendizado nas diversas fazes que vivenciei de 2003 a 2009.
A Rede trazia na sua primeira fase a grande mobilização em torno do Programa Fome Zero, com objetivo de implantar os Conselhos Gestores em cada município, para que a sociedade pudesse fazer o controle social do Programa. Naquele ano o Brasil não era mais o mesmo, havia um grande entusiasmo da vitória de Lula, a sociedade estava motivada e fortalecida pelo decreto do Governo Federal que dava autonomia aos Conselhos de intervir diretamente sobre as irregularidades que pudessem acontecer no âmbito do Programa.
Surgia no país um novo contexto político de gestão participativa e isso provocou um grande debate nacional sobre o que fazer e como fazer controle social. Foi um momento em que a sociedade, as academias e os gestores públicos em todos os municípios do Brasil se mobilizaram em defesa do Programa Fome Zero. No Ceará participei do primeiro grande encontro da sociedade civil para discutir a formalização dos Conselhos. Em outro momento, estava também em encontro com Frei Betto, mentor e Coordenador da Rede que veio ao Ceará discutir a importância do envolvimento da sociedade na execução do Programa.
A implantação dos Conselhos Gestores provocou reações dos prefeitos conservadores, que se posicionaram contrários aos Conselhos, argumentando a “intervenção da sociedade e do Governo Federal na gestão pública municipal”. Com esse argumento juntaram-se a Senadores e Deputados conservadores e marcharam rumo a Brasília, exigindo a revogação do Decreto de criação dos Conselhos Gestores. O Governo recuou e mudou o conteúdo, tornando-o mais brando, ou seja, tirando a autonomia da sociedade e dando mais poder aos gestores locais. Esse recuo desmotivou a participação da sociedade e os Prefeitos passaram a executar aos seus modos.
Durante todo esse período, a Rede no Ceará esteve muito presente nessa discussão, inclusive contraria ao recuo do Governo.
Com esse grande desfecho conjuntural, a Rede desencadeia nova estratégia político-pedagógica de realizar oficinas nos municípios para discutir os conteúdos do Decreto e a forma de participação da sociedade e dos gestores públicos a partir das políticas públicas e não só compensatórias. Dessa forma a equipe de educadores do Ceará se divide por regiões e passa a realizar encontros e oficinas de formação sócio-político-pedagógicas para capacitar lideranças e educadores capazes de realizarem novas intervenções nos municípios, integrando gestão pública e sociedade civil na perspectiva da elaboração de projetos e execução das políticas púbicas de inclusão social, direcionados para os beneficiários do Bolsa Família e àqueles que não foram beneficiados, que encontram-se em situações até piores.
Durante esse processo, realizei várias oficinas em doze municípios envolvendo Prefeitos, Secretários de Estado, Pastores, Padres, Pastorais, Sindicatos, Associações, ONGs, lideranças comunitárias, professores, educadores de alfabetização, assentados. Assim fomos constituindo núcleos de educadores em cada município com a finalidade de serem multiplicadores desse processo de gestão participativa. Em alguns municípios havia dificuldade do envolvimento do poder público local, mas as lideranças após passarem por um processo de formação assumiam e seguiam seus próprios caminhos, junto com a Rede de Educação Cidadã.
A terceira fase da Rede no Ceará foi trabalhar com os educadores capacitados nos municípios e estes passaram a fazer oficinas com os beneficiários da Bolsa Família em seus próprios municípios, como forma de sensibilizá-los para o processo de organização, capacitação e resgate cultural da vida no campo e na cidade buscando assim, qualidade de vida, autoestima e produtividade naquilo que conhecem e sabem fazer, seja na agricultura familiar, na arte, cultura e até retornar aos estudos.
Estes foram os passos que trilhei no Ceará, por meio da RECID, durante esta fase, onde fiquei responsável pela Região Metropolitana, o lado leste e oeste do litoral e parte do sertão, envolvendo 12 municípios (Fortaleza, Beberibe, Aracati, Barreiras, Itaitinga, Trairí, Amontada, Itarema, Morrinhos, Meruoca, Milhã e Quixeramumbim, no Sertão Central). Nessa fase a Rede preocupou-se em fazer formação junto às lideranças dos municípios para que estes fizessem o controle social, organizasse as famílias do Programa Bolsa Família e pensassem com as prefeituras, políticas publicas de geração de emprego e renda. Foi um período de grande crescimento sócio-político, inclusive com a retomada das organizações sociais.
Numa outra fase, me envolvi no debate nacional de consolidação da Rede, participei de encontros de formação com educadores de todo o país, da Região Nordeste e ajudei a organizar estudo estadual e Microregionais no Ceará.
Com o processo de consolidação da RECID como organização autosustentável nasce um novo debate sobre as parcerias: quem é e em que nível é a parceria? Ou seja, quais as entidades, ou organizações sociais que constituem a Rede enquanto poder direto, de fato e de direito? No âmbito da Rede sempre foi uma discussão interminável porque ela provoca outra via de debate que envereda pelos altos e baixos da própria organização a nível nacional, onde a Secretaria de Assessoria Especial do Governo com a equipe do Talher controla a RECID nos Estados, o que transparece com uma organização estatal, porém civil, porque envolve ONGs no convênio, na gerência dos recursos e contratos dos educadores. Dessa forma a Rede se torna cada vez menos autônoma, até porque os convênios e contratos de educadores são temporários, portanto geram insegurança e descontinuidade nas atividades. Estes fatores também são motivo do afastamento de várias parcerias porque levam a um desgaste nas suas bases devido à quebra de continuidade nos trabalhos desenvolvidos nas oficinas. Estes são alguns dos desafios que estão em debate na Rede quanto à consolidação. Um dos meios para autonomia da Rede, apontados na última reunião que participei na Coordenação Nordeste, seria transformar a RECID em entidade. Nesse eixo, a forma de construir unidade seria o próprio PPP e PPB para unificar uma linha de pensamento político e promoção de grande debate nacional, com fortes desafios.
A elaboração coletiva do Projeto Político Pedagógico, na perspectiva da construção de um Projeto Político para o Brasil significou uma riqueza de aprendizado acumulado desde os primeiros encontros nacionais, quando ficavam expostas as diferenças regionais, com a tentativa de dominação, buscada muitas vezes no grito, na manipulação ou conchaves. Os grandes encontros nacionais foram mostrando que o caminho não seria esse, para se construir um Brasil diferente com suas desigualdades regionais. Ali havia uma aparência de que todos queriam igualdade política, econômica e social, mas quando se tratava de regiões, as mais ricas queriam sobrepor-se às mais pobres, numa visão de superioridade e inferioridade no olhar econômico e de espécie. Quando o debate vem para o campo dos conhecimentos, saberes e organização, percebe-se que as aparências de fato enganam. Dessa forma o embate ideológico, de raças, de etnias, de brasis perpassando por dentro da RECID, possibilitou toda uma construção coletiva de novos parâmetros para uma convivência harmônica no pensamento de nação.
Para chegar até aí, foi necessário beber na fonte da linguagem de Paulo Freire, Florestan Fernandes, Caio Prado, Darcy Ribeiro, Antônio Gramsci, Marilena Chauí, Karl Marx e outros. No entanto, com todas essas teorias sem o exercício prático de troca de experiências vividas na RECID, seria impossível compreender a dimensão da educação popular que está em curso neste país, lá na base, nas “quebradas”, “nos cafundó”, “nas bibocas”, nas favelas, nas áreas de risco, bairros periféricos, assentamentos resgatando vidas e promovendo cidadania.
Foi aí onde dediquei dias de minha vida, trabalhando na Rede de Educação Cidadã no Ceará, realizando oficinas nas comunidades dos pequenos municípios e em Fortaleza nas favelas da Fumaça e Entrada da Lua no Bairro Pici, fortalecendo as organizações comunitárias locais com formação e capacitação para as lideranças qualificando com mais eficácia suas intervenções nas políticas públicas entre estado e comunidade.
Esse trabalho da RECID, somado à experiência de 29 anos da AMORA (Associação de Organizadores Sociais e Serviço) e do ESCUTA (Espaço Cultural Frei Tito de Alencar), fortaleceu a penetração da comunidade nas políticas públicas governamentais a nível federal, estadual e municipal, proporcionando qualidade de vida e até a tomada de poder em determinados municípios.
Nessa empreitada de organizar o pensamento crítico sobre o papel do Estado e os direitos dos cidadãos e cidadãs a RECID deu uma grande contribuição no Pici, em Fortaleza proporcionando às pessoas passarem a buscar mais o engajamento nas capacitações que o próprio estado oferece dentro das políticas públicas. Ao passo que as pessoas iam participando, ou nos contados surgiam suas carências, novas parcerias ia-se buscar e os serviços foram se concretizando, como: oficinas sobre sexualidade para jovens e adultos, segurança, infraestrutura urbana, políticas de idosos, segurança alimentar. Nestas oficinas e na busca de direitos, foram percebendo a importância da participação e aí entraram nos Conselhos Gestores de saúde e educação, de políticas para juventude, cultura. Ao entrarem nas discussões encontraram outros campos de atuação que são as Conferências de Saúde, Educação, Saúde Ambiental, Segurança, Comunicação. Os idosos descobriram também que nas políticas de saúde, podiam voltar a mastigar com dentes e sorrirem aí foram buscar dentaduras na Universidade Federal do Ceará. Meu Deus! Precisa ver quanta alegria! Algumas nem saiam mais de casa, chegavam a me dizer: “Tenho vergonha de sair sem tente, estou tão feia assim”! Agora cantam, contam historias, dançam, paqueram e as relações em família mudaram radicalmente com autoestima elevada.
As entidades entram nas políticas públicas através de editais e outra parcerias nas áreas específicas às quais atuam, com princípios e missões humanamente solidários e compromissados com a transformação da cruel realidade.
A juventude do Pici recebeu formação como arte educador, voltaram a estudar e entrarem nas Faculdades por meio do Prouni e de vestibular nas Universidades Públicas. Muitos destes estão empregados na própria Prefeitura e participando na comunidade. Trabalhar com a juventude foi uma forma que encontramos, para que os trabalhos não sofram descontinuidade, principalmente qualificando-os como técnicos da área acadêmica, sendo eles da própria comunidade e que darão seqüência planejando as ações de acordo com suas próprias necessidades.
Assim, com a RECID pude dar minha colaboração como Educador Contratado e em outras horas como voluntário por acreditar ser esse o caminho da construção de uma sociedade justa e solidária capaz de promover a redenção do Ser humano e do universo.
Fortaleza, 29/08/09

domingo, 23 de agosto de 2009

CARTA PEDAGÓGICA DO CEARÁ

Ah! Quantas histórias e experiências de vida, ações que não param de acontecer. A RECID do Ceará é assim, iluminada pelo sol queimante lavado pelas águas caídas do céu, juntando torrões, o sertão virando mar e o mar ficando doce. Os peixes se amando e alimentando a fome de beleza.
É nesse leito de serra, sertão e litoral, que a Rede de Educação Cidadã - RECID no campo e na cidade se encontra com as questões ambientais, com a arte e cultura como movimento vital gerado no seio do povo, onde a juventude, mulheres, idosos, quilombolas, indígenas, pescadores, promovem desenvolvimento a partir da agricultura familiar, economia solidária, lutas urbanas e campesinas.
A REDE no Ceará é inspirada nos anseios das diversidades intergeracionais que orientam suas especificidades dinamizando potenciais e promovendo a valorização da dinâmica dos movimentos populares.
É nessa dinâmica que as pessoas se manifestam e se desnudam de seus sentimentos, desejos e sonhos. Expressam suas necessidades e carências que remete a um interagir com as políticas públicas. Gerando processos de capacitação, formação, autoestima, esperança, amorosidade, engajamento, conquistas e execuções efetivas de qualidade de vida.
Dessa forma, descobrem-se jóias preciosas, que são pescadas com fitas coloridas e com arte que vão dando laços afetivos, melhorando as convivências inter pessoais e coletivas, valorizadas no contexto da educação popular.
Esse é o jeito do fazer formação no Ceará, fortalece as manifestações populares e dialoga com as diferenças na busca do desenvolvimento local e universal.
É importante ressaltar que esse jeito de fazer é resultado do amadurecimento, na convivência dos conflitos gerados no processo interno e externo presente nas relações de gestão e conjuntura.
Compreendemos que nessa caminhada valoriza-se o Ser e os sonhos na perspectiva da construção do Projeto Popular para o Brasil.

“A vida é feita de glória
Para curtir e amar
Sentir a felicidade
Olhar o outro e mimar
Fazer a proximidade
E assim conquistar
Vida com qualidade”.

Leonardo Sampaio

RECID CEARÁ

EDUCAÇÃO PUPULAR É FAZER PENSAR

Fazer educação popular

É mergulhar no mundo dos pobres,

E fazer ele pensar,

Pra entender seu sofrimento

E assim poder cobrar

Direitos constituídos

Sem precisar mendigar.



O ESCUTA faz assim,

Com a arte popular

Reunindo toda família

Para em grupo conversar,

Contar suas histórias

E da infância lembrar

Dos tempos felizes de ontem

E com alegria cantar

Revivendo o passado

Pegando o ritmo a dançar

Tornando-a terapia

Trazendo na arte popular

Saúde e qualidade de vida

Pra quem vivia a chorar.



A família não é a mesma

Passa a ter outro olhar

Compreendendo sua história

Todos ficam a acreditar

Que a vida é feita de glória

Pra curtir e amar

Sentir a felicidade

Olhar o outro e mimar

Fazer a proximidade

E assim conquistar

Vida com qualidade.



Assim, a RECID também faz

Com a linguagem popular

Oficinas de formação

Pra poder conscientizar

Que existem políticas públicas

E que todos tem que buscar

Como direito assegurado

Para a vida melhorar.


Leonardo Sampaio*
16/08/09

sábado, 2 de maio de 2009

Oeste Metropolitano na luta por qualidade de vida

A Região Metropolitana de Fortaleza do lado Oeste, historicamente registra há vários séculos a existência indígena, começando possivelmente pela Tribo Anace que habita no Litoral Oeste cearense, de Caucaia a São Gonçalo do Amarante.
Buscar esta memória é tentar entender o racismo ambiental predominante no poder público e se os índios do lado Oeste ainda amedrontam os “homens brancos” da Aldeota que desprezam uma parte das Cidades de Fortaleza e Caucaia.
É interessante registrar que no lado Oeste fica localizada uma das paisagens mais bela da natureza, que são os mangues do Rio Ceará e do Rio Maranguapinho, além do encontro com o mar na Barra do Ceará entre dunas, praias belíssimas, riachos e lagoas.
É também no Oeste de Fortaleza, estendendo a Caucaia que concentra em espaços urbanos, grande massa de trabalhares e trabalhadoras oriundas da migração rural, por ausência de políticas públicas de convivência com o semiárido e da acumulação capitalista das riquezas produzidas, das extraídas da natureza, das novas tecnologias e do mercado financeiro.
Entre estes migrantes do Oeste, se misturam as raças brancas, pardas e etnias indígena, negra e quilombola. São povos “sobrantes” no mercado capitalista. Na sua grande maioria com pouca instrução educacional e capacitação profissional, razão pela qual sofrerem descriminação racial, ambiental e padecerem de cuidados e comprometimento dos governos com as políticas públicas que lhes dê qualidade de vida.
E por falar em qualidade de vida, essa população urbana do Oeste, não encontra nem mesmo espaços para cuidar da saúde por meio de caminhadas, esporte e lazer. Tanto em Fortaleza, quanto em Caucaia as caminhadas são feitas nas calçadas das avenidas entre fumaças de gás carbono dos carros e o risco de acidentes.
Mas não basta apenas lamentar, constatar, é necessário lutar, mesmo sabendo que a humanidade é assim, uns acomodam-se esperando o manjar cair do céu, ou simplesmente acreditam que os poderosos irão resolver tudo e outros reagem como fez o povo de Deus, através de Abraão, inspirado em Javé e foram à luta em busca de espaço para viver com dignidade. Assim também faz o povo do Oeste de Fortaleza que junto à Câmara Municipal de Fortaleza realizará uma Audiência Pública dia 7 de maio de 2009, no Colégio Santa Isabel às 14:00 horas, para cobrar a construção do Parque Rachel de Queiros e em Caucaia haverá a I Conferência Municipal da Igualdade Racial que acontecerá dia 5 de maio de 2009, no Salão Paroquial.
E assim o oeste metropolitano se manifesta por qualidade e plagiando dizemos: A luta continua, porque povo unido, jamais será vencido, por isso humanidade uni-vos.

Leonardo Sampaio
Educador - 02/05/09

Obra, poder e ação

Obra é sinônimo de quem faz,
Fé sem obra é nanição,
Obra no poder público,
É sinal de corrupção
Obra com fé
É sinal de salvação.

Muitos se arvoram no poder
Tendo como inspiração,
O desejo de se dar bem,
Outros com amor no coração
Querem fazer o bem
Inspirado no Deus da comunhão.

Poder e obra não se separam,
Assim Jesus nos ensinou,
Obra é a luz que alumia,
Poder é o dom que lhe enviou,
Para partilhar com natureza,
Os bens que a todos confiou.

A humanidade destoa
O poder que Deus lhes deu,
Por isso sofre Ele,
A natureza e os filhos seu,
Devido à ganância e o egoísmo
Que permanece no fariseu.

Com essa oração matinal,
Faz aumentar minha fé,
Que o mundo tem jeito,
Sem o mau do lucifé,
Mas com o amor de Maria
E o espírito de José.

Assim concluo dizendo
Que essa minha oração
Tirada do peito e da alma
É fruto da inspiração,
No Cristo libertador
Que me deu obra, poder e ação.

Leonardo Sampaio
19/04/09

sexta-feira, 10 de abril de 2009

ESCUTA 29 anos nos caminhos revolucionários



A busca de se seguir os passos no caminho que seguiu Jesus Cristo, o maior líder da terra, o homem que revolucionou o seu tempo e os templos é um desafio. Porque ele foi um homem capaz de confrontar poder político, econômico e religioso em defesa dos pobres, humildes, marginalizados, desprezados pelos três poderes. Encontrou ali o povo de Abraão, de Davi, de Moisés, da Região de Israel, Palestina, Canaã era o povo hebreu e judeu.

A arma mais poderosa, mais contundente e incisiva que levava para o combate, era o amor a humanidade. Para ele ninguém e nenhum poder tem o direito de escravizar, de tornar seres humanos e a natureza em deposito de lixo.

Como instrumento para o enfrentamento, levou em seu patuá munições capaz de enfraquecer o inimigo e diante deles puxou o gatinho e atirou com palavras que se fez verbo, anunciando que o verdadeiro amor se pratica com justiça, fraternidade, humildade e ação. Como bom guerrilheiro se fez profeta denunciando que quem pratica opressão e destruição em detrimento à vida não será digno do Reino de Deus.

E assim, com estes ensinamentos, o verbo se fez palavra na Favela da Fumaça, periferia de Fortaleza em 10 de abril de 1980. O tempo foi de ditadura militar, de perseguição, tortura, assassinato, de capitalismo selvagem, de Igrejas conservadoras. Por estes motivos o profetismo de Jesus Cristo se fez presente com palavras geradoras nos caminhos da liberdade, com a presença viva do nosso pastor maior D. Aloisio, das freiras, padres, seminaristas e pessoas leigas politizadas, missionárias que foram para o enfrentamento com a munição evangelizadora da fé, da esperança, da organização social em busca de melhorias da qualidade de vida, de moradia, de trabalho, saneamento e cidadania.

Morava ali uma população migrante das secas, das cercas, da fome, do latifúndio e foram jogados no espaço urbano, no mais elevado mundo do capitalismo anticristão. Eram brasileiros, brasileiras, nordestinos, nordestinas criaturas humanas vivendo em ambientes desumano. A esperança é depositada em Deus e nos poderosos, não vislumbram em si a capacidade de alcançar os sonho e a utopia. Aguardam apenas o manja cair do Céu, ou sobreviver de acordo com a vontade de Deus. Transfere assim para Deus um pai malvado, cruel que lhes oferece para vida o sofrimento, o comodismo. Os direitos estão nos ricos e pra si apenas a caridade.

Em meio a esse povo é que nasce a Comunidade Eclesial de Base - CEBs da Fumaça e o Espaço Cultural Frei Tito de Alencar - ESCUTA que completam 29 anos nos caminhos revolucionários de lutas e construção da cidadania.

A fonte inspiradora que fortalece essa resistência e insistência é a fé no Cristo libertador, que confiou apenas em 12 companheiros e ainda foi traído por dois, mesmo assim não desistiu de levar adiante seus ideais de salvar a humanidade dos males causados pela ganância, o egoísmo e o individualismo.

Leonardo Sampaio
Educador e poeta

sábado, 17 de janeiro de 2009

O ESCUTA e FÓRUM SOCIAL MUNDIAL

O Espaço Cultural Frei Tito de Alencar – ESCUTA se orgulha de ter mais quatro jovens neste ano de 2009 entrando na Universidade Federal do Ceará e dois esperam resultado do CEFET.
Tudo começou no ano de 2000, quando o ESCUTA realizava seu planejamento anual e deparava-se com o Grupo Utopia, que era formado por jovens vindo da Crisma desde a adolescência. A maioria destes jovens havia concluído o ensino médio. Quando da dinâmica de apresentação, ouvia-se dizerem que tinham terminado os estudos. Achei estranhas aquelas afirmações coletivas involuntariamente, era como se não tivessem perspectivas futuras de vôos maiores. Lembrei da águia criada no cativeiro junto com galinhas e nunca havia voado... (A Águia e a Galinha - L.Boff).
Eram jovens filhos de operários, biscateiros, lavadeiras de roupa que saiam da escola pública sem nenhum incentivo a leitura, nem a busca de novas tecnologias. Faculdade? Nunca nem imaginaram em enfrentar um vestibular, sentiam-se incapazes. O questionamento era: Como concorrer ao vestibular com os ricos que estudam nas melhores escolas particulares? É perda de tempo.
Suas vidas estavam voltadas para as profissões dos pais, ou algum bico de trocador, babá, lavar carro e outros.
Foi nesse planejamento do ano de 2000 que o ESCUTA priorizou trabalhar com jovens, levantar a auto estima deles, ouvi-los, propor, pensar juntos, construir ações coletivas, empoderá-los de novos saberes e assim nasceu a idéia de criar um curso de pré-vestibular no próprio Escuta.
O entusiasmo dos jovens foi enorme, ao retornarem logo fizeram um projeto para captação de recursos e na primeira tentativa conseguiu-se aprovação de parte do projeto para instalar uma biblioteca, já o pagamento de professores foi negado. Mas isso não foi motivo de desistência, partiu-se para buscar professores voluntários e doações de livros. Convidamos a imprensa falada, televisiva e escrita. A Verdes Mares veio e fez matéria ao vivo. A repercussão foi muito grande, de repente apareceram livros, professos e um grande número de jovens de toda a Cidade, nosso espaço não cabia tanta gente.
Com a divulgação na mídia outras experiências parecidas que já existiam na Cidade vieram ao encontro do Escuta, daí após algumas reuniões em conjunto nasce a idéia de procurar a prefeitura para implantar em cada Regional um cursinho. O projeto foi elaborado com a Coordenadoria de Educação. Porém, ficamos surpresos, quando esperávamos o prefeito anunciar o início dos cursinhos nas Regionais, ele chegou com o Sistema Verdes Mares lançando o Projeto de Cursinho Nossa Vez.
A experiência do Nossa Vez, com a organização do Cursinho Voluntário não deu certo, os professores tinham suas próprias metodologias que não se encaixavam.
O voluntariado também durou pouco tempo, não deu certo, muitos professores desistiam, ou encontravam horários de aulas em outros estabelecimentos e ficava sempre um vazio entre as aulas.
A turma não desistiu, formou grupos de estudos e os que dominavam mais algumas matérias passava para os outros. Veio o vestibular, doze se inscreveram na Universidade Federal do Ceará - UFC e alguns também na Universidade Estadual do Ceará - UECE. Oito passaram na primeira faze e caíram na segunda exatamente na redação, resultado do mau ensino na escola pública. Um passou na UECE
Esse primeiro resultado animou a turma e para dar prosseguimento aos estudos foi criado o Banquete Literário, com objetivo de estimular a leitura e a produção de textos como forma de superar a dificuldade na redação.
www.banqueteliterario.blogger.com.br
Parte do grupo se entusiasma pelo teatro, monta uma primeira peça baseada na literatura de cordel, “O Pavão Misterioso” e assim parte para pesquisa sobre o que cada um se identifica e isso facilitou a leitura e produção de texto.
Dessa forma o grupo busca novas parcerias e metodologias de ação e elabora o Projeto Circulo de Cultura Brincante, que é uma maneira de produzir a partir da arte instrumentos de leitura do mundo, numa visão critica e dialógica com o Circulo de Cultura na Escola indo até lá incentivar a leitura a partir do lúdico, a Roda de Rua com enquet problematizando a realidade do bairro e do povo e abrindo o debate e o Circulo de Fantasia trabalhando com as crianças a partir do olhar em seu território.
O resultado de tudo isso, é que com essa motivação do Escuta, mais 20 jovens da comunidade entraram nas universidades, adultos retomaram os estudos e também partiram para universidades. Além da questão local, a experiência expandiu-se em outros grupos e comunidades e hoje muitos já entraram ou estão se preparando para entrar em universidades.
Outro resultado importante na mudança de vida desses jovens, foi a elevação da auto estima das famílias, quando nem imaginaram ter filhos e filhas em uma faculdade.
Um terceiro resultado é que todos que passaram por essa experiência no Escuta estão empregados como arte educador na prefeitura de Fortaleza ou em Organizações não Governamentais - ONGs.
É devido a essas experiências êxitosas que o Escuta acredita que um outro mundo é possível e vai ao Fórum Social Mundial, que acontece de 27 de janeiro a 01 de fevereiro em Belém do Pará.

Leonardo Sampaio
Educador e pedagogo.

VI SIM, O PÔR-DA-LUA.

Vi sim,
vi o nascer da lua cheia,
vi o sol se pôr,
vi, entre as folhas verdes do meu jardim,
vi, entre paredes e galhos,
vi as arvores na selva de pedra,
vi os pássaros gorgojearem,
vi o amanhecer com o canto das aves,
vi e ouvi o coral dos pássaros no amanhecer,
vi o beija flor e o banhei com água da mangueira,
vi o peneirar feliz do cebito e o sanhaço nas gotas d'água.
Vi e ouvi os fogos que alegram pessoas,
vi os pássaros voarem assustados ao pôr do sol,
vi e ouvi o canto estressado do coral dos passarinhos,
vi a revoada dos periquitos em cardumes,
vi o desespero dos pássaros em busca do sossego,
vi que os soltadores de fogos não sentem a natureza,
vi que a vida é sentida no indivíduo,
vi que o mundo é de todos,
vi que todos não o percebem,
vi que todos não têm o mundo,
vi que o sol, a lua e as estrelas não brilha pra todos,
vi que a luz das lâmpadas esconde a beleza do universo.
vi que o planeta é nossa casa,
vi que é necessário salvarmos o planeta,
vi sim, o pôr-da-lua.

Leonardo Sampaio
25/12/2008

SALVEMOS O ÚLTIMO VERDE DO SÍTIO PICI

Os bairros Henrique Jorge e Jóquei Clube em Fortaleza tiveram o privilégio de ter uma moradora ilustre, a escritora Rachel de Queiroz. Ali existia o Sítio Pici, a cancela de entrada era na Rua Pe. Sá Leitão com Monsenhor Hipólito Brasil. Acima da cancela havia um arco com o nome Sítio Pici e no centro o Casarão onde Rachel escreveu seu primeiro livro, O Quinze. Bem próximo da Casa havia um açude, com afluentes do Riacho Cachoeirinha que nasce nos bairros Santa Fé (João XXIII) e Jóquei Clube. O verde prevalecia com paisagens de bambu, coqueiros, mangueiras, cajueiros e outras fruteiras. Nos alagados, os siris, caranguejos e nas águas os peixes e as garças, nos galhos das arvores os pássaros cantando e na mata os camaleões, teús, calangos, preás e no roçado ossadas de gado. Segundo moradores freqüentadores daquela casa o gado vinha das secas do Sertão de Quixadá, já chegavam ali magros de fome e às vezes não resistiam.
Lendo a memória da escritora Rachel de Queiroz sobre o Sítio Pici, identifiquei em uma foto, ela caminhando mais sua irmã sobre a parede do Açude do Sítio, quando ali moraram ainda bem jovens.
Aquela foto me surpreendeu e fortaleceu o espírito de enfrentamento de defesa daquela área verde, última existente da memória histórica do Sítio Pici. Até me emocionei quando lembrei que em 1966 quando cheguei a Fortaleza, também caminhei naquela parede do Açude, apesar de estar quebrada um trecho, mas ainda acumulava água e juntava animais naquela paisagem, muito verde, cheia de arvores, fruteiras e mata virgem.
No convívio com famílias que moram nessa região desde os anos 40, década em que a escritora ali morou, colhi histórias belíssimas sobre a beleza da natureza, as águas do Riacho e do açude eram limpas e cristalinas, as mulheres lavavam roupas nas cacimbinhas à beira do Riacho e as crianças tomavam banho e pescavam. Era um encontro de convívio do ser humano com o meio ambiente e ao mesmo tempo de lazer.
Esse visual que retrata um pouco dessa história que contrasta o urbano com o rural no município de Fortaleza, pode está chegando ao fim. É que o último espaço verde ainda existente do Sítio Pici, exatamente onde havia o açude, está à venda.
O Casarão continua ainda intacto, por generosidade da construtora que loteou o Sítio e deixou quatro famílias residindo nele, como forma de preservar.
Os movimentos sociais e culturais dos bairros no entorno do Sítio Pici, desde o início da década de 80, época das primeiras construções de moradias no loteamento vem num processo de resistência tentando sensibilizar os puderes públicos sobre a importância desses espaços para a cidade, do ponto de vista da preservação cultural, ambiental e lazer.
O Movimento Pró Construção do Parque Rachel de Queiroz, juntamente com o Espaço Cultural Frei Tito de Alencar – ESCUTA realizaram dia 15 de agosto 2008, a Trilha Cultural com o tema: Os caminhos da escritora Rachel de Queiroz no Sítio Pici.
A intenção é despertar a sociedade para a defesa da urbanização dessa última área verde restante no bairro Henrique Jorge, que é exatamente o leito do açude. Os movimentos articuladores da Trilha Cultural defendem que esse verde, seja entregue a comunidade como área de lazer, oferecendo melhor qualidade de vida à população.
Na pauta cultural está também o tombamento da Casa onde a escritora morou. A proposta é que seja transformada em biblioteca pública e exposições de artes como forma de estimulo a leitura e valorizar as artes em lugar que simboliza a literatura.
A grande surpresa dos movimentos sócias e culturais foi encontrar no dia 13/09/08 em vez de uma placa dos poderes públicos intervindo urbanisticamente na área, esta lá bem do lado da Praça da Igreja do Henrique Jorge uma placa em um poste da Avenida Heribaldo Costa com os dizeres VENDE-SE e a seta apontando para o “açude”. A indignação de repente se manifesta, aí falei para o Jucelino, que estava do meu lado. Só falta dizerem “vende-se um açude”. E comentava, é mais um desprezo pela preservação da cultura de um povo, de uma cidade. É a ausência da sensibilidade humana e a ganância manifesta de forma predadora da vida. É a indiferença do poder público com a preservação dos mananciais urbanos. Talvez não demore, em um curto espaço de tempo o “açude” será aterrado.
Nesse olhar sobre o desprezo do poder público, na passagem da Trilha, foi observado que nessa mesma área, do outro lado pela Rua Edgar de Arruda com Antônio Ivo tem uma construção obstruindo o canal de concreto feito pela prefeitura. É uma obra de drenagem feita no que já foi um Riacho afluente do açude.
Mas não é só isso, pela Rua Mons. Hipólito Brasil na mesma área verde, já foi aterrada uma parte e construído prédios e apartamentos que estão alugados no único terreno público dessa área.
A história não pára aqui, esse terreno no Henrique Jorge, é parte da área em que a própria Prefeitura de Fortaleza, elaborou o Projeto Parque Rachel de Queiroz, que custou 400 mil reais, pago pela Prefeitura a UECE/IEPRO. É também o Projeto que foi aprovado no Orçamento Participativo de 2005 na SER III. É o projeto que em 2008 foi defendido em Audiência Pública na Câmara de Vereadores e na Assembléia Legislativa. É o projeto que deputados e vereadores se comprometeram em liberar recursos de bancada para dar inicio as obras. É o projeto parte da carta do Grito dos Excluídos de 2008.
Pelo visto, não basta só se indignar, é necessário gritar, ou até acampar exigindo atitudes dos gestores públicos na preservação do verde, a serviço do bem estar e da qualidade de vida dos seus munícipes.

Leonardo Sampaio
Educador
20/09/08 reformulado 13/12/08