sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Particularidades étnicas em Caucaia

Caucaia tem uma particularidade no que se refere a etnias, tendo em vista os povos indígenas, negros e ciganos que formam uma miscigenação de raças que se diluem nos territórios entre descendências européias e o próprio europeu nas áreas turísticas.
No contato com as pessoas percebe-se que as culturas, a religiosidade e os costumes destes povos permanecem enraizados na alma negra e indígena por meio do sangue ancestral derramado nas senzalas e tribos ao longo dos tempos. Como prova basta saborear o tempero da gastronomia saída das cozinhas das mães preta e pais João, capoeira, maracatus, cantigas de rodas, artesanato, a produção agrícola e os terreiros.
O ambiente em que vivem no município revela o apartheid existente desde os séculos passados. As relações trazem o preconceito e a discriminação, o que os faz negarem sua raça, na tentativa de tornarem-se iguais. No entanto permanecem nas serras, sertões, cercados e favelas inibidos culturalmente de cultuar sua arte e a própria espiritualidade de suas origens africanas com os seus orixás. Assim como acontece com os povos indígenas que tiveram de negar a mãe terra com sua beleza natural e o pai tupã. Enquanto os brancos trazem a imagem de um só Deus e os obriga a adorar em nome da salvação eterna. Apresentam um homem bonito, elegante, que veio lá do céu, por entre as belezas das nuvens carregadas de água e vida. A mãe é uma mulher branca bonita, mística, simples, capaz de fazer-se presente em todas as culturas do universo, simbolizado por um pai onipotente, poderoso, rígido, porém amoroso aos que lhe seguem.
Desde a colonização quando os negros foram trazidos da África como mão-de-obra escrava para o Brasil, que seus valores, cultura, religião, suas heranças africanas foram 'arrancados'. A orientação oficial da igreja que justificava a escravidão naquela época era de que os negros não tinham alma e nem religião, portanto, podiam ser desrespeitados e escravizados. Assim, o negro teve que abrir mão de tudo que acreditava para enfrentar uma realidade de perseguição.
A primeira reação dos negros contra a intolerância religiosa foi uma estratégia de resistência conhecida como sincretismo religioso, ou seja, o africano escondeu a prática de seus valores religiosos por meio da prática da religião do seu dominador, só assim podia cultuar seus orixás, os comparando aos santos cultuados pelos portugueses. Surgindo aí o candomblé e a umbanda no Brasil como forma de resistência dos cultos afros, que continuaram sendo historicamente perseguidos e só obtiveram direitos adquiridos, assim como outras manifestações religiosas no Brasil, a partir da Constituição de 1988. (Fundação Cultural Palmares).
Todas as revelações ditas de Caucaia são resultados de um Brasil invadido, dominado, subjugado aos interesses econômicos de potencias ricas, que tentam impor suas culturas a outros povos, apenas pelo viés do interesse econômico, negando a vida, direitos, costumes, culturas e considerando-as sub-raças.
Esse modo de ver, de ser e de fazer destas potencias dominantes, se instalam dentro dos municípios brasileiros com as mesmas práticas discriminatórias e de exploração. Se levarmos em conta o município de Caucaia como exemplo, vamos encontrar as comunidades negras ou quilombolas, nos topos das serras, do sertão seco e até cercada literalmente como forma de resistência à especulação de “grileiros”, como são ditas nas histórias contadas pelos ancestrais, revelando que suas terras eram extensas como áreas de quilombos das sete comunidades negras que se localizam dentro do município: Serra da Rajada, Serra do Juá, Serra da Conceição, Porteiras, Cercadão, Boqueirão dos Cunhas e Camará.
Hoje no Brasil há políticas diferenciadas para estas áreas. O Governo Lula criou o Ministério da Igualdade Racial e Leis que beneficiam a raça negra. Como forma de reconhecimento da existência destas comunidades em Caucaia, o Governo Municipal na gestão do Dr. Washington Góis, por meio da Secretaria de Articulação Política criou Territórios de áreas geográficas e Territórios das etnias, entre eles o Território Quilombola para tratar das políticas públicas específicas asseguradas na legislação brasileira aos povos negros e quilombolas, bem como às 80 Comunidades Religiosas afro-brasileiras, sendo 15 de Candomblé e 65 de Umbanda já identificadas no município. "A essência das religiões de matriz africana é o culto à natureza, seus elementos, sua sabedoria. Cada orixá representa um elemento da natureza - fogo, água, terra e ar. Infelizmente, por falta de conhecimento de muitas pessoas há a intolerância religiosa. O sincretismo religioso, que teve que ser adotado pelos africanos que não podiam manifestar sua fé, fez uma associação errada dos orixás, como por exemplo associar Exu ao Diabo e não existe o culto ao diabo nas religiões de matriz africana", Afrobrasileiro, Maurício Reis, Diretor de Proteção ao Patrimônio.
Em 2009 algumas ações que foram realizadas no Território Quilombola, como:
Visitas às Comunidades Negras para apresentar o Território Quilombola e o Setor da Igualdade Racial do Governo Municipal;
• Entrevistas com as pessoas mais idosas para conhecer e registrar a história destas Comunidades;
• Reuniões para discutir os direitos das comunidades negras e quilombolas assegurados na constituição brasileira;
• I Conferência Municipal sobre a Igualdade Racial no Município;
• Cadastro dos Terreiros existentes no município;
• Comemoração com shows no dia da Consciência Negra – 20 de novembro;
• Reuniões com Federações e Movimentos Negro do Estado Ceará;
• Encaminhamentos dos Cadastros de Terreiros para o Ministério da Igualdade Racial;
Em 2010 ações em andamento articuladas com as políticas públicas de programas do Governo Federal.
• Reunião com o Programa Mova Brasil da Petrobrás para implementar alfabetização de jovens e adultos nas comunidades quilombolas de Caucaia;
• Reunião com a Rede de Educação Cidadã – RECID Ceará e Rede Talher Nacional – TN para programar Oficinas de Educação Popular e Cidadania nas Comunidades Quilombolas em Caucaia;
• Reunião com Núcleo de Africanidade Cearense – NACE da Universidade Federal do Ceará para incluir professores de Caucaia no Curso de Formação de Professores de Comunidades Quilombolas;
• Encontro de Planejamento da RECID / TN com a participação do Território Quilombola para planejar as Oficinas nas Comunidades;
• Reunião do Programa Mova Brasil com Sec. de Educação e Articulação Política para organizar 10 núcleos de alfabetização nas comunidades Quilombolas;
• Reunião com UFC/NACE para apresentar à Sec. de Educação do Município o Projeto de Formação de Professores nas Comunidades Quilombolas oferecendo 15 vagas para professores fazerem o curso. (A Lei Federal 10639 / 2003 assegura a implantação de educação diferenciada nas escolas de comunidades negras e capacitação em arte e cultural negra);
• Realização de Oficinas nas comunidades negras com vídeos e palestras discutindo o que é Quilombo para sensibilizar sobre o reconhecimento pessoal e coletivo como quilombola;
• A estrada da Serra do Juá esta sendo toda feita em calçamento para facilitar o Turismo ecológico e cultural com trilhas em cima da Serra. – Essa programação já se encontra no Folder da Sec. Turismo. (Comunidade Quilombola)
Pode-se afirmar que o Governo Municipal de Caucaia é hoje uma marca na história dos municípios, tirando a máscara do preconceito e do racismo existente no Ceará, quando se dizia que não tem índio nem negro. O Dr. Washington Góis teve a hombridade de Gestor Público trazendo as políticas públicas especificas das etnias e raças, criando a Coordenadoria de Assuntos Indígenas ligada diretamente ao seu Gabinete e nomeando um Articulador Territorial Indígena e outro Articulador Territorial Quilombola na Secretaria de Articulação Política para tratar das políticas de etnias asseguradas na legislação brasileira.
Dessa forma é que se faz a história dos negros, como foi feita a resistência de Zumbi dos Palmares contra a escravidão, formando Comunidades Quilombolas, Dragão do Mar no Ceará com o levante de não aceitar desembarcar escravos no porto e em Redenção a libertação dos primeiros escravos no Brasil.
Sabemos que isso ainda é pouco, mas são passos de avanços que fortalecem o movimento negro em Caucaia, no Ceará e no país assegurando direitos e a luta por igualdade racial.

Leonardo Sampaio
Educador Popular

sábado, 2 de janeiro de 2010

Casa da Rachel de Queiroz


Jornal O Povo
Artigo

Leonardo Sampaio
02 Jan 2010 - 01h34min

A Casa da Rachel de Queiroz é um patrimônio do povo, foi tombada em 22 de outubro de 2009 ``Decreto Nº 12.582/2009`` pela Prefeita Luiziane Lins, marcando uma história de luta contínuas da comunidade fortalezense desde 1983, quando se iniciou um processo de peregrinação passando por todos os prefeitos desta cidade durante todo esse período.

O Sítio Pici foi adquirido por Daniel de Queiroz, pai da escritora, em 1927 e ali a Rachel escreveu seus primeiros textos, como o poema ``Telha de Vidro``, o Folhetim ``A história de um nome``, o romance ``O quinze`` e ``João Miguel``. (Acioli & Casa do Benjamim).

São tantas as histórias que ouvi contadas pelas pessoas do Bairro Daniel de Queiroz (Decreto 1969) (Jóquei Clube) que conheceram a família da Rachel. Conversei com lavadeira de roupa, engomadeira, senhoras que na época eram criança e brincavam lá, tomava banho no açude, outras que pescavam, tiravam frutas, até um senhor que montava a charrete que a jovem Rachel ia para escola e passeava pelas ruas e estradas do bairro e até eu, que nos anos 60, entrava pela cancela, onde em cima havia um arco com o nome: Sítio Pici, ali ia caçar de espingarda e comer frutas junto com um amigo mais antigo no bairro que conhecia os caseiros dos Sítios. Eram muitos ao lado, tinham uns com nomes interessantes: Sítio do Papai, outro era Sítio da Vovó, outro Sítio do Papai do Céu, todos com vacarias e criação de outros animais de pequeno porte. Era uma região em que o rural misturava-se com o urbano, numa harmonia perfeita para os migrantes do Sertão.

Hoje, sem mais essa harmonia, nos resta conviver na selva de pedra e defender o pouco que ainda sobra de patrimônio histórico que é a Casa da Rachel de Queiroz e o único verde do entorno, como a APA - Área de Proteção Ambiental do Riacho Cachoeirinha e o Açude que fazem parte do contexto dos Sítios. Riacho onde as mulheres lavavam roupas, nas águas cristalinas das cacimbinhas que se formavam na margem.

Nessa área verde que resta, mais a Casa, defendemos que sejam transformadas em ponto de turismo com implantação de biblioteca infantil, com objetivo de incentivar a leitura, tendo como exemplo a própria Rachel e que o entorno da Casa seja preservado com urbanização adequada para lazer.


LEONARDO SAMPAIO
Educador, poeta e escritor
leonardosampaio5@yahoo.com.br