Vi de verdade,
Anjos com vela na mão,
É a luz que encandeia o caminho,
Pra subir ao céu,
A chamado de Deus.
Ele sabe o que faz.
Diz a mãe.
E acrescenta:
O bichinho nem comia mais,
Se é de sofrer aqui,
Vai viver em paz,
No céu,
Ao lado da virgem Maria,
Nossa mãe.
Ela vai cuidar dele com carinho,
Até eu chegar lá.
Vi com o zoi da cara,
Mãe seguir o mesmo caminho,
Pelos mesmos motivos,
Nem amamentar conseguia,
A palidez, a anemia
E o corpo frágil
Revelavam a razão.
Mas Deus,
Há de mostrar um jeito,
Ele é justo.
O sofrimento dela,
Será recompensado no céu
E Nossa Senhora,
Há de mostrar um jeito
Das crianças escaparem.
Diz a avó.
Vi com indignação,
Idosos seguirem o mesmo destino,
Como trapos humanos,
Sem forças pra produzir,
O mercado não lhe quer mais,
São excluídos do trabalho,
Viveram a vida na informalidade.
Só lhes resta
A vela e caixão
Para o encontro com o pai supremo,
E viver em paz.
Conforme a religião,
Pode nem ter mais mãe,
Para acolher no paraíso.
Vi com olhar crítico,
Que assim como Maria
Estes também foram migrantes
Lutaram por um lar
Ocuparam terras
Acenderam fogueiras.
Lugar de encontros
De histórias de vida
De trocas de saberes.
Quem sabe?
Os saberes do quilombo,
Do pai véi,
Dos orixás,
Nas matas dos sertões.
Das caçadas e caiporas,
Do vaqueiro, o violeiro,
A poesia e o repente.
Tudo era saudade,
Agora é a selva de pedra,
Que esconde o rural no urbano,
E a favela,
De pobreza e a miséria.
Vi em tudo isso,
A fome matar,
Agora vejo jovens,
De armas em punho,
Sem sonhos, nem utopia,
Entregues ao crime
Por um centavo
Pro crack
E até a vida
Vira coisa banal
Assim os pais,
Vão enterrando os filhos.
Sem encontrar razão,
Pra essa viagem.
Já não conseguem mais dizer,
Que é Deus que está levando,
Pra o seu encontro,
Dessa forma,
Refugiam-se nas religiões
Em busca de um supremo,
Que lhes conforte.
Vi assim
Igrejas lotadas
Sofrimentos intensos
E a fuga da realidade.
A conformidade
Com o irreal,
E a entrega a um deus,
Que não faz parte
Da história de Abraão,
De Moisés,
Do povo de Deus,
De José, Maria
E de Jesus Cristo
Que foram capazes
De defenderem os direitos
Das mulheres, pescadores, doentes,
De denunciar os poderosos
E estarem ao lado dos pobres,
Sem temer a morte.
Leonardo Sampaio
19 de maio de 2012
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