domingo, 23 de setembro de 2018

Ocupa casa Frei Tito


Leonardo Sampaio

Uma casa abandonada
No centro de Fortaleza
Na Rua Rodrigues Junior
Onde Frei Tito nasceu
Bem próximo a Aldeota
Foi lá que Tito cresceu
Jogando bola na rua
Tocando seu violão
Pois eram onze irmãos
Mais uma tia o pai e a mãe
Eram quatorze pessoas
Viviam harmonicamente
Numa pequena casinha
Socializavam tarefas
E todos participavam
Era família de fé
Num regime democrático
De prática socialista
Com partilha e bem comum.

Dona Laura era a mãe
Ildefonso era o pai
Eram pessoas bem humildes
Os filhos iam crescendo
Cada um seguiu seu rumo
O João virou comunista
A Nildes educadora
Outras eram domésticas
Alguns funcionários públicos
E o Tito religioso
Seguiu a causa dos pobres
Com Jesus de Nazaré
Por isso foi perseguido
No Regime Militar
Foi um grande alvoroço
Na família Alencar.
Tito preso e torturado
Na Ditadura Militar
Queria democracia
Defendia o evangelho
E a partilha de bens
Numa sociedade justa
Chamavam-no comunista
Contra o capitalismo
Por isso foi condenado
Foi preso e exilado.

Lá nas terras estrangeiras
Já sentia muita saudade
Queria estar com seu povo
Defendendo a liberdade
E um mundo de igualdade
Com muita fraternidade
Muito amor no coração
Paixão e misericórdia
Pra todos serem irmãos.

Era meigo e amoroso
Só queria, o bem do povo
Assim se manifestou
Escreveu carta e poesia
Sobre o amor que tinha
Pelo povo e sua terra.

Por não sentir mais retorno
Ficou um tanto alucinado
Em tudo via fantasma
Percebia torturadores
Lhe seguindo a todo tempo
Tiraram-lhe o âmago
Com tanta alucinação
Resolveu tirar a vida
Enforcado numa árvore.

Virou mártir dos torturados
E dos direitos humanos
Assim é reconhecido
Por todos que o admiram
E por isso não é esquecido.
Até a casa onde nasceu
Queremos preservação
Para guardar a memória
E assim manter sua história.

Mas a casa foi encontrada
Destruída e abandonada
E uma cristã aguerrida
Ao ver uma placa vende-se
Conhecia a vida de Tito
E que ali ele nascera
Correu atrás de amigos
Pra preservação da casa
E o patrimônio histórico
Para que fosse tombada
E assim aconteceu,
Mas ficou descuidada
Até no dia dez de agosto
Do ano dois mil e dezoito
Quando a Escola Bíblica
Frei Tito de Alencar
Se juntou com o Escuta
Que é o Espaço Cultural
Que homenageia o Frei
Prepararam celebração
E após entraram na casa
Arrancando uma grade
Viu-se o estrago que tava
Decidiu-se ficar dentro
Pois a casa era tombada
E ficou ali desprezada
Não houve o menor cuidado
Nem do dono nem prefeitura
Com vários vãos destruídos
Outras paredes quebradas
Todas as portas arrancadas
Pisos e tetos alterados
Gatos de água e energia
E com tudo desprezado.

Um documento foi lido
Levantando a bandeira
Pela desapropriação
Para criar o memorial
Do Frei Tito de Alencar
E dos demais torturados
Nas terras do Ceará.

Mas no dia onze de agosto
Aparece um dito dono
Era pai filho e capanga
Com murros e ponta pé
Expulsando os ocupantes
Fazendo muita arruaça
Houve gritos e ameaças
Despejo dos objetos
Todos jogados na rua
Mas os jovens lá presentes
Resistem sem abrir mão
Acusam o proprietário
Do abandono da casa
Mesmo ela sendo tombada
Por isso sua obrigação
É cuidar do patrimônio
Assim os jovens diziam
Articularam reforço
Foi chegando mais apoio
De repente muita gente
Advogados e padres
E mais outras lideranças
Foram pressionando o dono
Até que ele se afastou
Sem permitir ficar dentro
A calçada foi ocupada
Na frente do patrimônio
Até que a prefeitura
Faça a desapropriação.

O CEBI logo apoiou
E as Pastorais Sociais
As CEBs e organismos
Jovens da PJMP e PJ
Mais o Centro de Pastoral
Padres, Freiras e Leigos
E mais outras lideranças
Chegaram juntos no apoio
Fortalecendo a luta
E também a resistência
A juventude aguerrida.

No dia doze de agosto
Numa audiência pública
Feita na Secutfor
Entregou-se documento
Em que foi Protocolado
Com as reivindicações
Da Ocupa casa Frei Tito.

Os dias foram passando
Sem ter resposta concreta
O movimento resolve
Entrar na casa de novo
E em dezessete de agosto
Em outra celebração
O movimento retorna
E ocupa outra vez.
Já no outro dia seguinte
O suposto dono aparece
Com filhos e um policial
Usando arma em punho
Apontando para os jovens
Virou clima de terror
Bate boca e resistência
E muita pancadaria
Os jovens foram empurrados
Botaram todos pra fora
Foram chegando os apoios
Lideranças e advogados
Religiosos e os leigos
Entraram de casa a dentro
E a polícia se fez presente
Tentando apaziguar
E os donos intransigentes
Era muita discussão
De um lado e do outro
Até ir pra delegacia
Onde foi feito acordo
Com a casa ocupada
Em até sessenta dias.

Foi só mais um passo dado
Pra amenizar o conflito
Até o Prefeito desapropriar
Foi essa a meta fincada
Sem ter nenhum retrocesso
Da Ocupa casa Frei Tito.

As cobranças continuaram
Pra se chegar ao Prefeito
Adesões por todo lado
Até a família do Tito
Chegou a manifestar-se
Compreendendo que era a vez
De se chegar ao Prefeito
E a solução encontrar
Pois a muitos anos tentam
Sem nunca terem resposta.

Nas noites enluaradas
Ou no brilho das estrelas
E no sol abrasador
Os jovens vão resistindo
Ficam na casa dia e noite
Estudando e trabalhando
São meninas e meninos
Revelando a esperança
Que esse mundo tem jeito
Quando junta fé e vida
Em busca de um ideal
E Tito é inspiração.

São as noites mal dormidas
E os dias muito cansativos
Aguardando que o Prefeito
Um tal de Roberto Claudio
Dê resposta positiva
De desapropriar a casa
E implantar o memorial
Como bem patrimonial
Da Cidade e do mundo
Pelo fim das ditaduras
E pelos direitos humanos.

Cada dia tem coisa nova
São oficinas de croché
Cortes de cabelo e bordado
Filmes, jogos, teatro e músicas
Ofícios, rezas e cânticos
Como expressão de fé
No Cristo libertador
O Jesus de Nazaré
Homem forte e destemido
Que mesmo temendo a morte
Deu seu exemplo de vida
Sem temer aos poderosos
Mesmo sendo torturado
Preso e crucificado,
“Eles não sabem o que fazem”
Falou pregado na cruz.
Esse é o Deus desses jovens
Da Ocupa casa Frei Tito
Dando exemplo de vida
Com responsabilidade
Em defesa da justiça
Do direito e o bem viver.

Por isso não abrem mão
Querem a restauração
Dessa casa do Frei Tito
Para que a memória
Seja sempre preservada.

Já no dia dez de setembro
Nova notícia chegou
Da família de Frei Tito
Que o prefeito recebeu
Reuniu em seu Gabinete
E lá se comprometeu
De desapropriar a casa
Seguindo um calendário
De setembro a dezembro
Do ano dois mil e dezoito
Fazer a restauração
E em janeiro do ano novo
De dois mil e dezenove
Fazer inauguração.

Os passos a serem dados
Foi assinar três decretos
E o primeiro já foi feito
Em quatorze de setembro
No aniversário de Tito
E o Movimento ocupa
Fez a semana de festa
A família foi recordar
A casinha onde ele nasceu
Foi um momento de emoção
Entraram de casa a dentro
Contando cada detalhe
De como ali viviam
E o cantinho onde ele nasceu
Com a ajuda da parteira
Sendo o último da família.
E por lá permaneceram
Assistiram os palhaços
E muito se divertiram
São pessoas bastante idosas
E muito acolhedoras
Eram dois irmãos e a irmã
Nildes, Ildefonso e João.
Vieram pra comemorar
A promessa do prefeito
E também congratular
Com a Ocupa casa Frei Tito
Por ter feito aquele ato
De ocupação da casa
Correndo todos os riscos
Como foram as agressões.

Agora falta o concreto
Que o prefeito assumiu
Que é a desapropriação
Porque o Decreto não saiu
Pra efetivar a promessa
Com a criação do Conselho
Que ficará responsável
Pra instalar o memorial
Que é o terceiro decreto.

A Ocupa casa Frei Tito
Continua dentro da casa
Mantendo-se vigilante
Acompanhando os passos
Do Prefeito Roberto Cláudio
Das promessas assumidas
No encontro com a família.

O Movimento agradece
A todos que visitaram
E aos que colaboraram
Os homens e as mulheres
Todas famílias vizinhas
E as crianças do entorno
Da Rua Rodrigues Junior
Sempre presentes em tudo
Que ali foi promovido.
Pedimos também desculpas
Por transtorno ocorridos
Tirando o sossego da Rua.

Com a benção do divino
E todos deuses sagrados
Sou grato a todos/as vocês
Por cumprir essa missão
Que a mim foi delegada
De coordenar essa ação
Junto à tanta gente boa
Em nome da liberdade
Do direito e da justiça
E muita fraternidade.

A vitória é de todos e todas.
Frei Tito Vive.

23 de setembro de 2018


Um comentário:

Henriqueta disse...

Que beleza! A luta valeu a pena e você já conseguiu recontá-la em poesia! Parabéns!