Leonardo Sampaio
A década de 1970 o
Brasil vivenciara o período mais violento da Ditadura Civil Militar, foi
também o tempo em que eu começava uma militância política na
esquerda, conhecendo o processo revolucionário que vivia o mundo a
aquele momento. Muitos brasileiros foram mortos, torturados e
expulsos do País por defenderem a democracia e o socialismo.
No inicio da década de
oitenta, o Brasil inaugurava uma nova história com o retorno dos
patriotas de esquerda retornando ao país através da Lei da Anistia,
após vinte e quatro anos de exílio e repressão.
Os movimentos sociais
se erguiam com energias, principalmente no sindicalismo e movimentos
populares de bairros e favelas. Em todo o país estavam expostas as
sequelas da Ditadura com acumulo de riqueza nas mãos de poucos e
grande miséria para a maioria do povo brasileiro.
No Ceará
a situação se agravava com um longo período de seca que fazia com
que a população desassistida no campo se deslocasse para as
Cidades, aumentando as dificuldades de sobrevivência das pessoas nos
espaços urbanos, já que não era seu habitat nem na área
profissional e nem cultural o que levava também o município à não
assegurar assistências, moradia e emprego. Ao chegarem na Cidade,
muitos ficavam nas casas de parentes ou pagando aluguéis durante um
tempo. Com o agravamento da situação, saiam pelas ruas mendigando.
Os programas de governo não eram suficientes para atendê-los. Sem
poderem pagar aluguel e continuar por muito tempo na casa dos
parentes, começaram a ocupar terras ociosas na Cidade, aumentando o
número de moradias inadequadas por não ter saneamento básico,
escola, unidade de saúde além de provocar grandes conflitos entre
ocupantes, proprietários e o Estado que é obrigado a garantir o
direito à propriedade, assim também, como direitos aos
cidadãos(ãs), mas quase sempre a este ultimo é negado.
Nesse
processo de ajuntamento de forças entre proprietários de terras e o
Estado contra a população carente e desamparada entra os partidos
de esquerdas ainda na clandestinidade disputando esse espaço ao lado
da população oprimida, com as bandeiras de melhoria de condições
de vida, organização da sociedade em associações comunitárias e
o engajamento partidário para juntar forças em busca do poder
Executivo e Legislativo.
Ao lado
dessa luta por transformações nas estruturas de poder, entram
também, setores da Igreja Católica, que, baseados na Teologia da
Libertação se organizam nas Comunidades Eclesiais de Base – CEBs
envolvendo Bispos, Padres, Freiras e leigos engajados e com a Bíblia
na mão refletem a partir da fé e a palavra de Deus, os direitos de
cidadania e assim, entram na periferia das Cidades pregando a
dignidade humana, a organização dos oprimidos e a luta por
liberdade.
Em
Fortaleza a disputa pela hegemonia das organizações sociais dividiu
as esquerdas, em que, uma parcela fundou a Federação de Bairros e
Favelas de Fortaleza - FBFF acreditando nas mudanças estruturais
pela via institucional do Estado e outra que apostava na via
revolucionária através da luta armada.
Nesse
processo de disputa e organização, a FBFF ia encaminhando ofícios
para as instituições públicas com as reivindicações, enquanto
isso as CEBs e o outro movimento de esquerda chama o povo para as
ruas e cria a Jornada de Luta Contra a Fome, organizando grandes
assembléias pelos bairros e favelas, fazendo uma pauta de
reivindicações e junto com as lideranças que iam se formando nessa
luta, transformam as carências em um projeto que determina o que
cada comunidade propõe. O objetivo era fazer com que o poder público
pudesse transformá-las em ações das políticas públicas.
A
estratégia utilizada para entregar esse documento ás autoridades e
posteriormente cobrar os resultados apresentados, era realizando
grandes caminhadas com cerca de dez mil pessoas, rumo à Prefeitura e
ao Governo do Estado.
Essa
mobilização da sociedade excluída fez surgir fortes lideranças e
sensibilizou a classe média e intelectual tendo como interlocutora a
Deputada Estadual Maria Luiza Fontinele que foi eleita Prefeita em
1985, com um mandato interino de três anos, de 86 a 88.
Naquele
período eu estava presente, na organização das CEBs, fundação do
PT, na mobilização da Jornada de Luta Contra a Fome, na construção
clandestina do Partido da Revolução Comunista – PRC, na campanha
para eleição da Maria Luíza à Prefeitura de Fortaleza e vivendo
financeiramente por conta própria, como vendedor de representação
comercial.
A cada
momento nesse processo participativo, exigia da militância, mais
compromissos e foi o que me levou a essa sequência de engajamentos
que teve inicio em 1978, e que funcionava como uma escola de
aprendizado da práxis e da formação política, da educação
popular e administrativa das organizações sociais. Eram momentos de
lutas que exigiam leitura, reflexão, ação, avaliação.
Nos anos
de 1986 a 1988 já na Gestão da Prefeitura de Fortaleza, tive uma
nova experiência que era por em prática o discurso de antes, para
dentro da administração pública e um dos grandes desafios foi
enfrentar a direita e parte da esquerda fazendo oposição à
Administração Popular, principalmente por que estavam juntas na
Gestão do Governo do Estado do Ceará e do Governo Federal, enquanto
que a Prefeitura das Capitais funcionava como uma Secretária desses
poderes, sem nenhuma autonomia financeira para gestar o município. A
situação era de total dependência.
Haja
visto, que a participação da população no processo político do
País era tão distante que aos 32 anos de idade foi a primeira vez
que eu votei para Governador em 1982, para Prefeita em 1985 e para
Presidente da República em 1986, isso, devido ao período da
Ditadura Militar que durou 24 anos, onde o Presidente da Republica
era nomeado por um colégio eleitoral formado por Generais, os
Governadores dos Estados e um Senador eram nomeados pelo Presidente,
os Prefeitos das Capitais eram nomeados pelos Governadores, vejam
quanto tempo o povo passou sem votar. Só na Constituição de 1988
houve mudanças nas Leis e abertura política, por isso, estamos
ainda hoje em um aprendizado do processo de participação popular no
exercício do poder público.
09
/ 06 / 2005
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