segunda-feira, 7 de março de 2011

O amor tem cor? E sentimento tem pigmento?


Leonardo Sampaio

31/12/2010

A vida eu sei que é feita de cores com raios solares do amanhecer, o clarão da lua cheia com céu estrelado, o por do sol entre lagos, montanhas, arco-íres e a escuridão da noite colhendo orvalho nas folhas verdes, umedecendo o ar e fertilizando a mãe terra. Diante de tanta poesia e cores será que o amor pode ser negro? Diria que todas as cores são dádivas do ser supremo, com os mesmos sentimentos nos corações e mentes para que o ser humano possa amar com plenitude a natureza e a própria espécie sem distinção pigmentar. Ao falar de amor e coração será que sentimento tem pigmento? Entendo que sentimento é desejo que parte da alma, da afetividade, do coração e da mente fertilizada com amor e todas as cores que embelezam a vida.

Toda essa poesia carregada de interrogações, parte de lembranças da época de criança quando ouvia histórias de amor proibido entre raças e classes sociais, que hoje fazendo um curso de especialização em educação para comunidades negras, acho interessante trazer estas perguntas para refletirmos a discriminação racial e até onde ela afeta o sentimento das pessoas. O fato aconteceu com um tio meu Julio Sampaio Sobrinho que se apaixonou por uma moça de cor preta e quis casar. Era uma negra trabalhadora doméstica e filha de trabalhador da roça, ele branco, fazendeiro e dono de engenho. Logo que a família do soube do romance tratou de proibir, utilizando questionamentos relacionados com valores, costumes, raças e heranças que segundo a família do seu Julinho (como era conhecido), estas quatro coisas eram incompatíveis entre as raças e as classes sociais, portanto o casamento seria a perpetuação de incompatibilidades raciais, que até pode ser visto pelo víeis cristão da família “branca” de Nazaré, já que a cristandade era muito influente e exercia a proibição aos moradores agregados de realizarem manifestações religiosas e culturais afrodescendente. Diante destes fatores, entre o amor e o sentimento prevaleceu a discriminação pigmentar da cor e a moça foi forçada a se retirar do município sobre ameaça de morte.

Mesmo assim, o amor negro, posteriormente renasce no rapaz, dessa vez com uma professora negra, meiga, cuidadosa e solidária que chegou no município para dar aula às crianças, já que a localidade era distante dos centros urbanos e não havia escola pública nem professores/as com nível escolar suficiente para ensinar o primário. Diante dessa carência as famílias de proprietários de terra bancaram uma professora vinda de Fortaleza para ensinar as crianças pobres e as mais abastardas. A professora foi morar na casa da mãe de seu Julinho que ainda era solteiro, foi aí que os dois começaram a paquerar e as relações ficaram mais intimas e a família do rapaz mais uma vez ficou de olho nesse amor negro e logo encontrou um jeitinho “discreto” para a professora voltar pra Fortaleza.

E assim, as cores da vida que conheci no infinito cósmico, pigmentaram corações e mentes com racismo e desagravo ao amor e ao sentimento humano das raças.

Leonardo Sampaio é educador popular e pedagogo.

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