Autor:
Leonardo Sampaio
Um Guará de
tanto chupar cana ficou gordo e baixinho. Ele vivia no campo em um lugar
chamado queimada, que ficava bem distante das áreas urbanas e bem próxima da
comunidade negra do Urubu. Era um animal que tinha muito medo de andar à noite,
por isso gostava de aproveitar os dias para visitar familiares, passear ou
fazer negócios. Seu transporte preferido era andar montado em uma mula branca,
mansa, paciente e bastante robusta para agüentar o peso do Guará. Nessas suas
andanças nem sempre dava tempo resolver tudo que queria antes de escurecer. E os
motivos eram variados, podia ser devido a histórias longas que teve de ouvir, ou
um bate-papo, um almoço e uma soneca depois da refeição e até um jantar. Assim
o dia ia passando, o sol vai se pondo, os pássaros param de cantar e se
recolhem aos seus galhos ou ninhos, os animais deitam e repousam remoendo o
alimento, que comeu durante o dia. A noite escura chega, as estrelas vão
brilhando, o sereno começa a cair, o clima vai esfriando e quando tem lua cheia
a paisagem da caatinga e do serrado no sertão nordestino fica mais encantador.
Porém, durante
as noites muitas coisas estranhas acontecem nas matas que ficam ao lado das
estradas empoeiradas ou úmidas das chuvas. São coisas que aparecem e fazem
arrepiar, como: o barulho da rasga mortalha, o canto da coruja, o assobio da caipora
e o açoite nos cachorros, as almas do purgatório, tochas de fogo, lobisomem,
morcego vampiro, raposa pegando galinhas, furão, comendo ovo nos ninhos e o
pior de tudo é que no caminho mais próximo pra sua casa ao passar pelo Sítio
Gruta tem o Bode da Braúna que é um bicho valente e destemido que sai de dentro
da mata e pula no meio da estrada na hora em que o bicho homem aparece em seu
território, durante a noite. Já na outra estrada mais longa pra chegar a sua
casa, indo pelo Sítio Roncadeira, aparece às almas do purgatório pedindo reza
pra se salvar ou as tochas de fogo em lugares onde o bicho homem foi
assassinado e condenado ao inferno.
Tudo isso
assusta até a mula que chega mesmo a se acôar pra não passar. Por isso, não tem
quem faça o Guará passar nesse caminho depois que escurece, nem mesmo com a
companhia da mula. Quando acontece de chegar à noite e o Guará ainda estiver
distante de casa, ele dá um grito chamando atenção dos amigos, vai até a casa do
parente Guaxinim e um dos filhotes muito corajoso, que não tem medo de nada,
vai deixá-lo em casa, montado em um cavalo. Depois o filhote de Guaxinim volta
sozinho sem temer nenhuma assombração, porque aprendeu na escola que o animal
mais perigoso é o bicho homem que destrói até o próprio ambiente que ele mesmo
mora. Mas o filhote de Guaxinim é destemido assim, porque aprendeu também, que todas
essas histórias, são lendas e que nada acontece de verdade, a não ser criada
pelo medo, ou pela criação da mente humana, como o sonho.
27/10/2013