sábado, 17 de janeiro de 2009

O ESCUTA e FÓRUM SOCIAL MUNDIAL

O Espaço Cultural Frei Tito de Alencar – ESCUTA se orgulha de ter mais quatro jovens neste ano de 2009 entrando na Universidade Federal do Ceará e dois esperam resultado do CEFET.
Tudo começou no ano de 2000, quando o ESCUTA realizava seu planejamento anual e deparava-se com o Grupo Utopia, que era formado por jovens vindo da Crisma desde a adolescência. A maioria destes jovens havia concluído o ensino médio. Quando da dinâmica de apresentação, ouvia-se dizerem que tinham terminado os estudos. Achei estranhas aquelas afirmações coletivas involuntariamente, era como se não tivessem perspectivas futuras de vôos maiores. Lembrei da águia criada no cativeiro junto com galinhas e nunca havia voado... (A Águia e a Galinha - L.Boff).
Eram jovens filhos de operários, biscateiros, lavadeiras de roupa que saiam da escola pública sem nenhum incentivo a leitura, nem a busca de novas tecnologias. Faculdade? Nunca nem imaginaram em enfrentar um vestibular, sentiam-se incapazes. O questionamento era: Como concorrer ao vestibular com os ricos que estudam nas melhores escolas particulares? É perda de tempo.
Suas vidas estavam voltadas para as profissões dos pais, ou algum bico de trocador, babá, lavar carro e outros.
Foi nesse planejamento do ano de 2000 que o ESCUTA priorizou trabalhar com jovens, levantar a auto estima deles, ouvi-los, propor, pensar juntos, construir ações coletivas, empoderá-los de novos saberes e assim nasceu a idéia de criar um curso de pré-vestibular no próprio Escuta.
O entusiasmo dos jovens foi enorme, ao retornarem logo fizeram um projeto para captação de recursos e na primeira tentativa conseguiu-se aprovação de parte do projeto para instalar uma biblioteca, já o pagamento de professores foi negado. Mas isso não foi motivo de desistência, partiu-se para buscar professores voluntários e doações de livros. Convidamos a imprensa falada, televisiva e escrita. A Verdes Mares veio e fez matéria ao vivo. A repercussão foi muito grande, de repente apareceram livros, professos e um grande número de jovens de toda a Cidade, nosso espaço não cabia tanta gente.
Com a divulgação na mídia outras experiências parecidas que já existiam na Cidade vieram ao encontro do Escuta, daí após algumas reuniões em conjunto nasce a idéia de procurar a prefeitura para implantar em cada Regional um cursinho. O projeto foi elaborado com a Coordenadoria de Educação. Porém, ficamos surpresos, quando esperávamos o prefeito anunciar o início dos cursinhos nas Regionais, ele chegou com o Sistema Verdes Mares lançando o Projeto de Cursinho Nossa Vez.
A experiência do Nossa Vez, com a organização do Cursinho Voluntário não deu certo, os professores tinham suas próprias metodologias que não se encaixavam.
O voluntariado também durou pouco tempo, não deu certo, muitos professores desistiam, ou encontravam horários de aulas em outros estabelecimentos e ficava sempre um vazio entre as aulas.
A turma não desistiu, formou grupos de estudos e os que dominavam mais algumas matérias passava para os outros. Veio o vestibular, doze se inscreveram na Universidade Federal do Ceará - UFC e alguns também na Universidade Estadual do Ceará - UECE. Oito passaram na primeira faze e caíram na segunda exatamente na redação, resultado do mau ensino na escola pública. Um passou na UECE
Esse primeiro resultado animou a turma e para dar prosseguimento aos estudos foi criado o Banquete Literário, com objetivo de estimular a leitura e a produção de textos como forma de superar a dificuldade na redação.
www.banqueteliterario.blogger.com.br
Parte do grupo se entusiasma pelo teatro, monta uma primeira peça baseada na literatura de cordel, “O Pavão Misterioso” e assim parte para pesquisa sobre o que cada um se identifica e isso facilitou a leitura e produção de texto.
Dessa forma o grupo busca novas parcerias e metodologias de ação e elabora o Projeto Circulo de Cultura Brincante, que é uma maneira de produzir a partir da arte instrumentos de leitura do mundo, numa visão critica e dialógica com o Circulo de Cultura na Escola indo até lá incentivar a leitura a partir do lúdico, a Roda de Rua com enquet problematizando a realidade do bairro e do povo e abrindo o debate e o Circulo de Fantasia trabalhando com as crianças a partir do olhar em seu território.
O resultado de tudo isso, é que com essa motivação do Escuta, mais 20 jovens da comunidade entraram nas universidades, adultos retomaram os estudos e também partiram para universidades. Além da questão local, a experiência expandiu-se em outros grupos e comunidades e hoje muitos já entraram ou estão se preparando para entrar em universidades.
Outro resultado importante na mudança de vida desses jovens, foi a elevação da auto estima das famílias, quando nem imaginaram ter filhos e filhas em uma faculdade.
Um terceiro resultado é que todos que passaram por essa experiência no Escuta estão empregados como arte educador na prefeitura de Fortaleza ou em Organizações não Governamentais - ONGs.
É devido a essas experiências êxitosas que o Escuta acredita que um outro mundo é possível e vai ao Fórum Social Mundial, que acontece de 27 de janeiro a 01 de fevereiro em Belém do Pará.

Leonardo Sampaio
Educador e pedagogo.

VI SIM, O PÔR-DA-LUA.

Vi sim,
vi o nascer da lua cheia,
vi o sol se pôr,
vi, entre as folhas verdes do meu jardim,
vi, entre paredes e galhos,
vi as arvores na selva de pedra,
vi os pássaros gorgojearem,
vi o amanhecer com o canto das aves,
vi e ouvi o coral dos pássaros no amanhecer,
vi o beija flor e o banhei com água da mangueira,
vi o peneirar feliz do cebito e o sanhaço nas gotas d'água.
Vi e ouvi os fogos que alegram pessoas,
vi os pássaros voarem assustados ao pôr do sol,
vi e ouvi o canto estressado do coral dos passarinhos,
vi a revoada dos periquitos em cardumes,
vi o desespero dos pássaros em busca do sossego,
vi que os soltadores de fogos não sentem a natureza,
vi que a vida é sentida no indivíduo,
vi que o mundo é de todos,
vi que todos não o percebem,
vi que todos não têm o mundo,
vi que o sol, a lua e as estrelas não brilha pra todos,
vi que a luz das lâmpadas esconde a beleza do universo.
vi que o planeta é nossa casa,
vi que é necessário salvarmos o planeta,
vi sim, o pôr-da-lua.

Leonardo Sampaio
25/12/2008

SALVEMOS O ÚLTIMO VERDE DO SÍTIO PICI

Os bairros Henrique Jorge e Jóquei Clube em Fortaleza tiveram o privilégio de ter uma moradora ilustre, a escritora Rachel de Queiroz. Ali existia o Sítio Pici, a cancela de entrada era na Rua Pe. Sá Leitão com Monsenhor Hipólito Brasil. Acima da cancela havia um arco com o nome Sítio Pici e no centro o Casarão onde Rachel escreveu seu primeiro livro, O Quinze. Bem próximo da Casa havia um açude, com afluentes do Riacho Cachoeirinha que nasce nos bairros Santa Fé (João XXIII) e Jóquei Clube. O verde prevalecia com paisagens de bambu, coqueiros, mangueiras, cajueiros e outras fruteiras. Nos alagados, os siris, caranguejos e nas águas os peixes e as garças, nos galhos das arvores os pássaros cantando e na mata os camaleões, teús, calangos, preás e no roçado ossadas de gado. Segundo moradores freqüentadores daquela casa o gado vinha das secas do Sertão de Quixadá, já chegavam ali magros de fome e às vezes não resistiam.
Lendo a memória da escritora Rachel de Queiroz sobre o Sítio Pici, identifiquei em uma foto, ela caminhando mais sua irmã sobre a parede do Açude do Sítio, quando ali moraram ainda bem jovens.
Aquela foto me surpreendeu e fortaleceu o espírito de enfrentamento de defesa daquela área verde, última existente da memória histórica do Sítio Pici. Até me emocionei quando lembrei que em 1966 quando cheguei a Fortaleza, também caminhei naquela parede do Açude, apesar de estar quebrada um trecho, mas ainda acumulava água e juntava animais naquela paisagem, muito verde, cheia de arvores, fruteiras e mata virgem.
No convívio com famílias que moram nessa região desde os anos 40, década em que a escritora ali morou, colhi histórias belíssimas sobre a beleza da natureza, as águas do Riacho e do açude eram limpas e cristalinas, as mulheres lavavam roupas nas cacimbinhas à beira do Riacho e as crianças tomavam banho e pescavam. Era um encontro de convívio do ser humano com o meio ambiente e ao mesmo tempo de lazer.
Esse visual que retrata um pouco dessa história que contrasta o urbano com o rural no município de Fortaleza, pode está chegando ao fim. É que o último espaço verde ainda existente do Sítio Pici, exatamente onde havia o açude, está à venda.
O Casarão continua ainda intacto, por generosidade da construtora que loteou o Sítio e deixou quatro famílias residindo nele, como forma de preservar.
Os movimentos sociais e culturais dos bairros no entorno do Sítio Pici, desde o início da década de 80, época das primeiras construções de moradias no loteamento vem num processo de resistência tentando sensibilizar os puderes públicos sobre a importância desses espaços para a cidade, do ponto de vista da preservação cultural, ambiental e lazer.
O Movimento Pró Construção do Parque Rachel de Queiroz, juntamente com o Espaço Cultural Frei Tito de Alencar – ESCUTA realizaram dia 15 de agosto 2008, a Trilha Cultural com o tema: Os caminhos da escritora Rachel de Queiroz no Sítio Pici.
A intenção é despertar a sociedade para a defesa da urbanização dessa última área verde restante no bairro Henrique Jorge, que é exatamente o leito do açude. Os movimentos articuladores da Trilha Cultural defendem que esse verde, seja entregue a comunidade como área de lazer, oferecendo melhor qualidade de vida à população.
Na pauta cultural está também o tombamento da Casa onde a escritora morou. A proposta é que seja transformada em biblioteca pública e exposições de artes como forma de estimulo a leitura e valorizar as artes em lugar que simboliza a literatura.
A grande surpresa dos movimentos sócias e culturais foi encontrar no dia 13/09/08 em vez de uma placa dos poderes públicos intervindo urbanisticamente na área, esta lá bem do lado da Praça da Igreja do Henrique Jorge uma placa em um poste da Avenida Heribaldo Costa com os dizeres VENDE-SE e a seta apontando para o “açude”. A indignação de repente se manifesta, aí falei para o Jucelino, que estava do meu lado. Só falta dizerem “vende-se um açude”. E comentava, é mais um desprezo pela preservação da cultura de um povo, de uma cidade. É a ausência da sensibilidade humana e a ganância manifesta de forma predadora da vida. É a indiferença do poder público com a preservação dos mananciais urbanos. Talvez não demore, em um curto espaço de tempo o “açude” será aterrado.
Nesse olhar sobre o desprezo do poder público, na passagem da Trilha, foi observado que nessa mesma área, do outro lado pela Rua Edgar de Arruda com Antônio Ivo tem uma construção obstruindo o canal de concreto feito pela prefeitura. É uma obra de drenagem feita no que já foi um Riacho afluente do açude.
Mas não é só isso, pela Rua Mons. Hipólito Brasil na mesma área verde, já foi aterrada uma parte e construído prédios e apartamentos que estão alugados no único terreno público dessa área.
A história não pára aqui, esse terreno no Henrique Jorge, é parte da área em que a própria Prefeitura de Fortaleza, elaborou o Projeto Parque Rachel de Queiroz, que custou 400 mil reais, pago pela Prefeitura a UECE/IEPRO. É também o Projeto que foi aprovado no Orçamento Participativo de 2005 na SER III. É o projeto que em 2008 foi defendido em Audiência Pública na Câmara de Vereadores e na Assembléia Legislativa. É o projeto que deputados e vereadores se comprometeram em liberar recursos de bancada para dar inicio as obras. É o projeto parte da carta do Grito dos Excluídos de 2008.
Pelo visto, não basta só se indignar, é necessário gritar, ou até acampar exigindo atitudes dos gestores públicos na preservação do verde, a serviço do bem estar e da qualidade de vida dos seus munícipes.

Leonardo Sampaio
Educador
20/09/08 reformulado 13/12/08