TEXTOS e POESIAS

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

UM ANDARILHO EM ABAIARA



Minhas lembranças de Abaiara
Têm um olhar de beleza
Viajando como andarilho
Apreciando a natureza
Com o raiar do sol
E amanhecer de nobreza.

Vejo as comunidades
Sítio Areia, Lage e Lageiro
Olho D’água da Pedra e Queimada,
Serra da Mãozinha e Tabuleiro
Baixio dos Caboclos e Araújo
São terras de feijão ligeiro.

Olho D´água Cumprido
Pinga e Gitirana,
Vazantinha e Caatinga Grande
Capivara, terra de cana
Gangorra e Campestre
São lugares, muito bacana.

Sítio dos Moreiras,
Gruta, Mudubim e Pocim,
Massapê e Livramento
Café da Linha e Brejim,
Capim de Burro e Ema
Baixa Danta e Cupim.

Urubu, Carmo e Belém,
Unha de gato e Marizeira,
Sítio Fundo e Tatajuba,
Vila São José e Roncadeira,
Sítio Alto e Taboca,
Lagoa Cercada e Gameleira.

Pontal do São Felipe,
Ponta da Serra e Camará,
Serrote Redondo e Capoeira
Vila da Conceição e Arapuá
Cajueiro, Catingueira
Serra da Arara e Tamanduá.

Agora vejo os riachos
São Pedro e Boqueirão
Olho D´água da Pedra
Baixa Danta e Fundão
Riacho Fundo, Sagui
Camelo, Jitirana e Torrão.

Vejo cacimbas e cacimbões
Na Roncadeira a Lagoa
Café da Linha um Açude
Com orvalho e garoa
E a Bacia do Rio Salgado,
Onde transborda água boa.

Agora falo da flora
O Angico e Marmeleiro,
Pau D´arco e Trapiá,
Pau fero e Pau Pereiro
Macambira e a Aroeira,
Canafista e Espinheiro.

De frutas me faz lembrar
Lima, Laranja e Limão
Sapoti, Oliveira e Manga
Coco, Cajá e Fruta-pão
Goiaba, Caju e Maracujá
Pitomba, Siriguela e Mamão.

Agora falo dos pássaros
O Sonhaçu e Cancão
Casaca-de-coro e Gaivota,
Bem-ti-vi e Gavião
Cebito e Galo-Campina
Bigodeiro, Sofreu e Casacão.

Caboclinho e Rolinha
Beija flor e o Sabiá,
Pinta-silva e Marreca,
Nambu, Lavandeira e Carcará
Codorniz e Juriti
Anum, Seriema e guará.

Canário cinza e amarelo
Com seu canto desafiava
O Golo e o Caboclinho
Pra ver quem entoava
O mais belo canto
Que a todos encantava.

O galo na madrugada
É um bom despertador
Com seu corococó.
E bem cedo é o Beija-flor
Com pose para beijar
A mais linda flor.

Da raiz da mandioca
Faz farinha e manipueira
Goma fina pra tapioca
Cozido de macaxeira
Bolo fofo e mole
Pra ninguém dizer bobeira.

Da Cana de açúcar
Vi garapa e rapadura,
Feitos no engenho
Com moagem e fervura
E a cachaça que esquenta
O juízo da criatura.

Vi produtos do milho,
Espiga cozida e assada
Cuscuz e pão de ló
Farofa com carne passada
Bolo de milho verde
E massa bem peneirada.

Baião de dois com toucinho,
Com cancão bem machucado
É uma comida gostosa
Mas precisa ter cuidado
Para não exagerar
Nesse alimento pesado.

Na casa de farinha
Ainda pequeno brincava
Na safra de farinhada
Onde o povo cantava
Descascando a macaxeira
Enquanto, o caititu ralava.

Enquanto a roda rodava
Com a Cia e o caititu
A mulherada animava
Mais Pedro Bem e Antônio Ginu
E a produção aumentava
Com tapioca e beiju.

O transporte da produção
Era com o cambiteiro
Que tangia os animais
Tinha nome de Cajueiro
E o carro de boi gemendo
Tangido por Chico Carreiro.

Na festa da padroeira
Do Coração de Maria
Que é Santa protetora
Dos devotos da romaria
É onde fé e folclore
Vem com pífano e cantoria.

Nas manifestações de fé
Cada casa tem santuário
Onde as famílias reúnem,
Pra rezar o rosário
E tirar a novena
No alpendre do Belizário.

Dentro do oratório.
Fica cheio de imagem
De Santos dos devotos
Para lhes dá coragem
Aumentar sua fé
Pra não fazer bobagem.

Após o novenário
Tem a festa cultural
Entoada com cantoria
Do repentista local
Com poesia improvisada
E rima sensacional.

 Na preparação da roça
Corta o mato e arranca o toco
Bota fogo e faz coivara
É no tronco do pau oco
Que a abelha faz o mel
Que agente come com coco.

Na limpa do roçado
Pra cortar a capoeira
Usava-se a ferramenta
Da foice e a roçadeira.
E pra babugem a enxada,
A rama, o facão e a peixeira.

Em época de colheita
Do casulo do algodão
Homem, mulher e menino
Trabalhavam na catação
E o mesmo acontecia
Na colheita do feijão.

A semente nascia na cova
E o passarinho comia
Era ai que a baladeira
A meninada assumia
Com mais funda e badoque
Espantalho e gritaria.

Arma de fogo também
Pra matar passarinho
E espingarda era usada
Pra atirar nos bichinhos
Devoradores da planta
Que brota pequenininho.

Também havia caçadas
De tatu, peba e cutia
Punaré, cassaco e preá
Que por ali existia
Três coco, caçote e rã
Que no abrejado vivia.

Tetéu, Tejo e Raposa
Calango, Tiú e Camaleão
Onça preta e pintada,
Sapo cururu e furão
Bico-doce e lagartixa
Quase todos em extinção.

A Cobra cascavel,
Chocalhando com o rabo,
Depredando outros bichos
Valente que nem o diabo
Quando não mata aleja,
É preciso ter cuidado.

As abelhas eram tantas
Inchuí, Jandaíra e Africana
Inchu e Capucho
Amarela e Italiana
São produtoras de mel
Das flores de jitirana.

Animais e pássaros morreram
Por queimadas e espingardas
A inocência do homem
Não permitia a guarda
De proteção ambiental
Pra vida ser resguardada.

A cultura no município
Sempre foi uma coisa viva,
Com coco, reisado e forró
Banda de pífano ativa
Tocando samba, xote e baião,
Arte que o povo cultiva.

Vi a cultura nordestina
Que é muito apreciada
Com pandeiro, zabumba e sanfona
Triangulo e viola afinada
Danças, chamego e Xodó,
E remelexo da mulherada.

Uma noite participei
De um forró no Campestre,
O candeeiro aceso,
E o sanfoneiro feito à peste
No terreiro o chinelo arrastava
Com música do meu nordeste.

Domingo Cândido era,
O sanfoneiro afinado
E com triangulo e zabumba
Tocou forró e xaxado
E quando a saia rodava
O trio ficava animado.

A poeira levantava,
E o cabra abufelado
Dançando arrochadim
Com o corpo todo colado
E a cabocla assanhada
Caprichando no rebolado.

Fui criança em sintonia
Com a arte e a cultura
E as Lages era o celeiro
Onde tudo se mistura
Religioso e profano
Política e literatura.

Tinha enforcamento do Juda
Poesia de repentista
Caretas e penitentes
Reisado, coco e humorista
Samba e artesanato
E os caboclos artistas.

Chico Pedro e Antônio Izida
Eram quem fazia a graça
Os dois eram humoristas
Contavam histórias na praça
Com muita gaiatice
Faziam prosas na raça.

Nos Lageiros os penitentes
Tinham ali sua cruz
De lá saiam cantando
Os benditos de luz
Sofrimento e salvação
Em nome de Jesus.

Com laminas se açoitavam
Por ordem do Decurião
Senhor Manoel Amâncio
É que puxava a canção
Depois veio o Dico
Que deu continuação.

Tudo isso se misturava
Com a festa da Santa Cruz
Novena de Nossa Senhora
E do Coração de Jesus
Onde as beatas cantavam
O hino da divina luz.

Nos Lageiros há encantos
Com suas locas e cruzeiros
Xiquexique e mandacaru
Turismo de brasileiros
E Fósseis que atraem
Turistas estrangeiros.     

Duas famílias marcaram
A história daquele lugar
A de Maria Viado
Que lá veio ficar
Com medo da guerra
Na Loca veio morar.

A família Felix
Maria, Ana, Livino e Raimundo
Que num barraco de palha
Fizeram dali o seu mundo
Entre o raiá e o por do sol
Com sofrimento profundo.

Lembro a grande enchente
Que em Abaiara aconteceu
Em mil novecentos e sessenta e seis
Quando o riacho encheu
A capela de São Pedro ruiu
E a rua de baixo sofreu.

Cercas e animais
As águas iam arrastando
Canas, capins e fruteiras
Nada ia sobrando
O leito do riacho sumindo
Com a erosão aterrando.

Recordo os engenhos
E o canavial com pendão
Onde as andorinhas
Faziam reprodução
Com grandes revoadas
Em época de verão.

O bebedouro do gado
Ficava em uma nascente
Resistindo as secas
Como único sobrevivente
Pra matar a sede
De animais resistentes.

É no Sítio Gangorra
Que até hoje existe
Essa fonte d’água
Que à seca resiste
Com sapos e mergulhão
Que na vida persiste.

Futebol foi um esporte
Que em um time joguei
No campo do Araújo
E de campeonato participei
Jogando no meio campo
Com muitos gols vibrei.

Nas pegas de boi
Em bons cavalos andei
Acompanhando os vaqueiros
Que muito admirei
Dudé, Aloísio e Zequinha
A família que muito amei.

Valentes e destemidos
Na mata, serra ou capoeira
Por onde o boi corria
Não ficavam na poeira
Na estrada e no algodão
Ou na caatinga rasteira.

Nas soltas de gado
Juntava-se a vaqueirama
Raimundo Bem e Miguel de Calda
Muitos vaqueiros de fama
Libório, Dodó e Zé Francisco
Pra soltar o gado na rama.

Partiam todos vestidos
De perneiras e gibão
Em cavalos muito bonitos
Prontos pra apartação
Era só escapulir um boi
Que entravam logo em ação.

Nessa tangida de gado
O aboio é que orienta
O rumo que o bicho vai
E a rima é que sustenta
O canto do vaqueiro
Que até a voz aumenta.

E o vaqueiro aboiava
Onde pastava boi barbatão
Com cela, alforje e peitoral
Montado no cavalo alazão,
Cabeçada, espora e pedal
Perneira, sapato e gibão.

Estes arreios de couro
Antônio Pedro fazia
Chicotes, celas e cabeçadas
Usando a sabedoria
De um artesão perfeito
Trabalhava com maestria.

Antônio Gonçalo faz tudo
É ferreiro de primeira
Faz faca, machado e facão
Foice, punhal e roçadeira
Planta roça e colhe a safra
E trabalha com madeira.

Toca pífano e zabumba,
É um artista nato
Criou banda cabaçal
Toca tarol e nos pratos
Mostrando o seu talento
E ainda luta no Sindicato.

A família Nonato
Tem vaqueiro e artesão
Poetas e repentistas
Cantoras na celebração
Desporte e radialista
Mantendo a tradição.

O cavalo de cela
Tinha que ser baixeiro
E aí Chico Clemente
Fazia o bicho maneiro
E chegou Vicente Raimundo
Outro mestre matreiro.

Na culinária Maria Damásia
Fazia comida gostosa
Que todos apreciavam
Mas na Vovó era a Rosa
Que dava todo o tempero
Ouvindo histórias e prosa.

As meninas Henriques
Sempre tiveram presentes
Otávia, Bibi e Toinha
Eram pessoas contentes
Lavavam e engomavam
Sempre alegres e sorridentes.

Papai e mamãe
Leônidas e Mundinha
Um casal acolhedor
Que amanhece na cozinha
Bota lenha no fogão
E o cuscuz logo cozinha.

Criaram 18 filhos
Com trabalho e oração
Fé, esperança e amor
Essa é a orientação
Que lhes acompanha
No caminho da salvação.

O professor Levi
Filho de Abaiara
Pesquisou a geografia
E muita coisa achara
Que desafia a ciência
Física e humanitária.

Objetos que identificam
Índios e Quilombolas
Ali foram encontrados
Mostrando que agora
As etnias existentes
Já se conhece na escola.

Sabíamos apenas de focos
E só se ouvia falar
Do feitiço e mandinga
Que o negro tem no lugar
Por isso era isolado
Pra não se manifestar.

Mas a ancestralidade
Tem ali a benzedeira
Que tira o quebrante
E com galho a rezadeira
Cura toda doença
Com cumaru e aroeira.

A geografia da UFC
Com pesquisa orientada
Queria entender Abaiara
A história registrada
Li livros e jornais
Pra vê o que era contada.

Foi na academia de letras
Que comecei a descobrir
E registrar que São Pedro
Foi primeiro nome a existir
Depois Pedro Segundo
Até a lei corrigir.

De acordo com os registros
Pedro Segundo foi repetido
No Piauí já existia
E não podia ser competido
E o decreto foi anulado
E Abaiara foi concedido.

Toda essa história passou
Na década de quarenta
Mas foi em 1959
Que o município fomenta
Sua primeira eleição
Entrando para sessenta.

Elegendo Zé Filomeno
Seu primeiro prefeito
Para o desenvolvimento
Fazendo do jeito
Construindo estradas
Foram metas do seu pleito.

Julio Sampaio Sobrinho
Foi o próximo prefeito
Que trouxe a energia
Que teve muito efeito.
Fez praças e escolas
Com resultados perfeito.

Após esses mandatos
A política desandou
Cada um mais desonesto
E o município desmantelou
Só se fala em corrupção
Um deles, até a verba levou.

A ordenação do Pe. Duza
Foi a maior festa local
Com autoridade de todo canto
Notícias em rádio e jornal
Espalhou-se na região
Sobre a missa sacerdotal.

Tudo isso é saudosismo
Até a extinção animal,
Que passou, por uma geração
Que achava tudo natural
E não se tinha a dimensão
Do crime ambiental.

Os fosseis fazem parte
Da cultura local
Mesmo ignorados
Pelo poder governamental
São pedras com peixe e dinossauro.

Na história também vimos
Que o Pe. Ibiapina
Fez ali açude, igreja e cemitério
Depois voou, como ave rapina
Deixando a sua marca
Sábia, santa e fina.

Concluindo essa história
Que será sempre, inacabada.
Agradeço a minha família
E a meus camaradas
E gerações conterrâneas
Sintam-se abraçadas.

Minhas lembranças guardadas
Bebendo leite de jumenta
Sendo um menino forte
Que a mãe terra alimenta
Da Gangorra para o mundo
E Abaiara me acalenta.

No alforje parti levando
A arte e a cultura
Do meu cariri querido
De muita beleza e fartura
De queijo e carne assada
Romance e literatura.

Assim findo a história
Da minha terra natal
Mostrando o passado
Escrito da capital
Do Estado do Ceará
A Fortaleza imortal.

Leonardo Sampaio
Educador Popular
Revisado 11/02/2013





Origem de Abaiara.

Antes era denominada de São Pedro e foi tornado Distrito pelo ato provincial de 27 de março de 1873. O nome São Pedro foi mudado para, Pedro Segundo, através do Decreto Lei nº 448 de 20 de dezembro de 1938, do então Interventor Federal no Estado do Ceará, Dr. Francisco Menezes Pimentel, que quis homenagear o segundo Imperador do Brasil. Por motivo da existência de outro Distrito com o mesmo nome no Estado do Piauí, houve impedimento constitucional da permanência do nome Pedro Segundo, e aí foi criado o Decreto Lei 1.114, em 30 de dezembro de 1943, que denominou de Abaiara, nome indígena que na língua Tupi-significa homem superior, pessoa importante. Por meio do Decreto Lei nº 3.921, de 25 de novembro de 1957, o Distrito de Abaiara é constituído município desmembrado de Milagres e em 25 de março de 1959 é eleito o seu primeiro Prefeito Sr. José Filomeno Filho.

Fontes:
Raimundo Girão – Historiador – Os Municípios Cearenses e Seus Distritos.
Diários Associados – Jornais: Correio do Ceará e Unitário.
Academia Cearense de Letras.
Instituto Histórico do Ceará.
Mapa do Município de Abaiara

O autor:
Leonardo Furtado Sampaio é educador popular, pedagogo e saiu de Abaiara aos 16 anos pra estudar em Fortaleza, nunca perdendo na memória as raízes culturais de infância e adolescência.
Leonardo tem outras memórias escritas, sobre o município, como: A negra pintada de branco; História de assombração; Infância, saudade e dor; Arte e cultura em Abaiara; O Juda do meu pai; De Abaiara as saudades são tantas e Homenagem ao vaqueiro Dudé.


Podem ser encontrados online.
www.leonardofsampaio.blogspot.com

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